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OS BRUTOS TAMBÉM AMAM (SHANE)

Este faroeste de 1953 é um dos mais famosos do gênero. Na verdade é tido como um “clássico” e está em terceiro lugar na relação dos melhores westerns do American Film Institute, perdendo apenas para Rastros de ódio e Matar ou morrer. Entretanto, eu estou com aqueles que não o colocam entre os melhores faroestes da história, embora concorde a respeito de suas inúmeras virtudes e que seja tido como um “clássico”, justamente por sintetizar, em um só filme, todos os elementos do gênero. Isso é realmente verdadeiro, porque na chamada “década de ouro” dos westerns poucos rivalizaram com ele em diversos aspectos e pelo conjunto deles, podendo ser destacados: para começar, a fotografia do filme é magnífica (época do início do CinemaScope) e as locações são deslumbrantes (vastos cenários); a tocante música incidental Beautiful dreamer (em gaitinha de boca e por poucos momentos) homenageia Stephen Foster, que a compôs por volta de 1860, mas sua música-tema é por si só marcante e permanente, pontificando intensamente ao longo de todo o enredo (“The Call of the Far-Away Hills“ de Victor Young); há o misterioso homem solitário, cuja primeira imagem vai-se formando ao fundo, em uma cena inicial de grande beleza, onde em primeiro plano aparecem o menino, um cervo e as águas que emolduram o rancho da família, próximo ao sopé das majestosas montanhas – homem esse, que a partir dali será o seu herói; há o contraste entre os que resistem às transformações do Oeste selvagem em civilizado (em outras palavras: deixar de se fazer justiça pelas armas) e os que desejam fixar suas raízes na terra, plantar, criar, constituir família e progredir; há o congraçamento de famílias e amigos dentro do pequeno núcleo constituído; há o armazém onde todos compram e o saloon onde ficam, bebem e jogam inclusive os malfeitores, há as brigas, os tiros, além, é claro, do pistoleiro vilão, muito bem representado pelo estereótipo do mal, na figura do carrancudo ator Jack Palance, com seu rosto “esculpido” em maldade, suas vestes escuras e dois ameaçadores revólveres. E, de quebra, tem a história da idolatria do menino pelo estranho que sabe atirar e também a da reprimida atração da esposa devota pelo mesmo valente e generoso herói (e deste por ela), embora haja os freios da decência e até da amizade. São protagonistas Alan Ladd (no grande papel de sua carreira), Jean Arthur (atriz que se notabilizou em comédias nas décadas de 30 e 40), Van Heflin (experiente ator de muitos filmes) e o garoto, então, com 11 anos, Brandon DeWilde (que continuou carreira por muitos anos, até morrer tragicamente em um acidente de automóvel). O diretor é George Stevens (Um lugar ao sol, Assim caminha a humanidade) e foi indicado no Oscar 1954, assim como o filme concorreu também nas categorias de Melhor filme, Melhor ator coadjuvante (dupla indicação: Palance e DeWilde), Melhor roteiro adaptado e Melhor fotografia, sendo vencedor apenas nesta última. Por tudo isso, é considerado “o faroeste por excelência” e, portanto, um clássico (vamos esquecer do patético título em português…). Entretanto, apesar de seu lado técnico que ainda hoje deslumbra, das qualidades que possui e de algumas ótimas cenas (como a da luta que não aparece e sim se adivinha e acompanha pela reação dos animais em torno), suas linhas mestras acabaram, com o tempo, ficando clichês e ficaram sedimentados os seus personagens como sem nuances ou camadas (ou seja, “maniqueístas”), o que na época de modo algum soou como demérito mas hoje pode ser considerado fato relevante no aparente paradoxo de um “clássico” não estar entre os melhores faroestes da história, conceito de alguns, embora não seja compartilhado ao que parece pela grande maioria, formada por fãs ardorosos. 8,9