ASSUNTO DE FAMÍLIA (SHOPLIFTERS)

O

Os filmes do diretor Hirokazu Kore-eda são singulares: possuem muita humanidade, são extremamente bem feitos em todos os sentidos, apresentam ângulos originais de situações comuns, belos momentos de pessoas e de situações e também surpresas em seu roteiro, que inicia na mansidão mas posteriormente a subverte. Talvez para questionar o que é, afinal, a felicidade e o que é certo e o que é errado neste mundo. No caso, o tema é como o próprio nome indica: familiar. Trata-se de uma família pobre, numerosa inclusive considerando limitado espaço e parte dela trabalha fora – em atividades moralmente questionáveis – para sustentar o todo. Família que inesperadamente vai aumentar. E eis o foco principal da história! Que envolve o jogo da sobrevivência ou da própria educação ou mesmo do sistema imposto. E também resgata a milenar questão: mãe é quem gera ou quem cria? O fato é que mesmo nas condições precárias de subsistência assim todos lutam, se adaptam e os sinais evidentes são de união, amor, amizade e afeto. Mas, como já dito, a estabilidade não dura para sempre e tempestades haverá, para exigir talvez desse núcleo aparentemente sólido a resposta social desejada. E provocar abalos inesperados. Kore-eda mostra a afetividade familiar e a educação caseira (que substitui, com justificativa apresentada, a escolar) em pequenos e até líricos detalhes e a questão é a percepção dessa realidade diante do que a sociedade espera, mas, por outro lado, do que esse modo de viver propicia a todos, sob o ponto de vista de benefícios, de crescimento, formação, visão ampla das coisas. Meios inadequados mas para um fim maior? É um filme bonito, comovente, profundo e bem realizado, com muito coração e conhecimento de causa. Entretanto, embora todo esse mérito, ele parece fugir do perfil daqueles que usualmente são premiados em Cannes, sendo, de certa forma, surpreendente ter ganho a Palma de Ouro em 2018. 8,7