COMO ERA VERDE MEU VALE

Este não é um filme comum, mas sim um trabalho muitíssimo bem realizado, com muita qualidade e conteúdo, inclusive na direção, de John Ford, que com o filme ganhou o Oscar de 1942 de Melhor diretor (na verdade, sendo bicampeão, pois em 1941 havia também sido premiado pela direção de As vinhas da ira). O único problema é que o filme ficou conhecido como aquele que “roubou os Oscar de Cidadão Kane” e às vezes por esse motivo não tem o seu real valor reconhecido. Na verdade, é difícil analisar os fatos no contexto daquela época, até porque Cidadão Kane foi algo assombroso, inovador, espetacular realmente. Vendo hoje, de forma imparcial, não haveria como deixar de dar o Oscar de melhor filme a Cidadão Kane e de melhor diretor a Orson Welles. Mas em 1942 a visão era diferente, com toda a certeza e, como já dito, eram outros tempos (inclusive de Academia…) e Como era verde meu vale tem muitas qualidades. Tanto, que além de ganhar os Oscars de Melhor filme e Melhor diretor, também ganhou de Melhor ator coadjuvante (Donald Crisp, o pai, excelente), Melhor direção de arte em p&b e Melhor fotografia em p&b (impecáveis ambas), tendo concorrido também nas categorias de atriz coadjuvante (Sara Allgood, a mãe, maravilhosa!), roteiro adaptado, trilha sonora, mixagem de som e edição. Foram 10 indicações ao todo e todas elas efetivamente merecidas. É uma história contada pela memória do menino já adulto e que se passa no final do século 19, em um vilarejo do País de Gales, com topografia e aparência absolutamente singulares (impressiona o contraste das casas da vida com as imponentes chaminés de fumaça preta). Lá existe uma mina de carvão, onde naturalmente trabalha praticamente toda a população, sendo o meio de sustento de todos.  E então surgirão os conflitos entre capital e trabalho, foco certo para a opressão da classe operária (nesse ponto o filme lembra um pouco a obra Germinal, de Emile Zola) e para movimentações paredistas e sindicais. O filme aborda fortemente esse ponto, como também enfoca outros, relacionados com o provincianismo, o preconceito e a hipocrisia social, incluindo a própria Igreja. Também são tratados com muita propriedade os costumes e a tradição, até mesmo na educação (e o bullying). Há o lado romântico e às vezes um excesso sentimental e melodramático, mas faz parte do estilo da época. O filme tem muitas pérolas -afinal é baseada na famosa obra literária do britânico Richard Llewellyn– e uma delas aparece durante o banho pós-trabalho, quando os operários tentam tirar do corpo o carvão das minas: o narrador, então, observa que nem todo o carvão sai com a água, passando a acompanhar aquele trabalhador pelo resto de sua vida. Além do casal já citado, todo o elenco é muito bom, destacando-se Walter Pidgeon (Mr. Gruffydd) e Maureen O´Hara (Angharda), embora o grande desempenho seja realmente do menino-narrador, interpretado pelo ator Roddy McDowall, na época com 13 anos e que mais tarde ficaria famoso como o Cornelius de O planeta dos macacos. Apesar de participar de vários outros filmes, esse ator não foi realmente um dos mais famosos do cinema, levando à certeza de que foi de fato quando criança que Roddy teve a maior atuação em sua carreira.  8,8