TEMPOS DE PAZ

Este impactante drama nacional de 2009, produzido e dirigido pelo competente Daniel Filho (que também interpreta um dos personagens, mostrando claramente também o seu carisma como ator), é um ótimo exemplo da qualidade do cinema brasileiro, mas pode bem ser vinculado a dois problemas: primeiro, trata de um assunto já exaustivamente abordado pelo cinema, mesmo que nem tanto em filmes brasileiros; segundo, é um espetáculo bastante teatral (se bem que os amantes de teatro não vão reclamar desse aspecto). Na verdade, tudo poderia perfeitamente acontecer em um palco, inclusive porque os dois protagonistas interagem em praticamente 90% da história. Porém, aqui o veículo cinematográfico se mostra de grande importância, tanto para enaltecer o foco dos fatos, quanto a excelência dos dois protagonistas (além de trazer uma bela trilha): Tony Ramos, em papel bem diferente daqueles em que estamos acostumados a vê-lo, está ótimo, tendo falas bastante intensas, ao especificar vários tipos de tortura que realizou e inclusive ao revelar o torturador sem remorso, pois esse sentimento é absolutamente vencido pelo argumento de ter agido sob ordens (por sinal, assunto tratado magistralmente pela escritora e filósofa política alemã Hannah Arendt – vide teorias sobre a “banalidade do mal”); e Dan Stulbach, em uma atuação estupenda, construindo um personagem todo próprio e efetivamente memorável. Seja meio teatral ou não, um trabalho bem realizado e que trata de forma séria e ao mesmo tempo poética, ao final, de assunto delicadíssimo. Além do fato de não serem comuns filmes que abordam a ditadura da Era Vargas, notadamente tendo agregada a temática dos imigrantes: os que fugiram das guerras  e das opressões e migraram para um Brasil de esperança e de novos e felizes dias, expectativas que nem sempre foram satisfeitas. Merece registro, ao final do filme, a sensível, lindíssima e nominal homenagem a diversos imigrantes vindos das guerras da Europa do século 20, com as suas importantes contribuições para a arte nacional. Com 10 indicações, o filme ganhou os prêmios de Melhor figurino e Melhor roteiro adaptado no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro de 2010 (o famoso Grande Otelo). Netflix. 8,5

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