LANCES INOCENTES (SEARCHING FOR BOBBY FISCHER)
Este é um filme de 1993 e com um belo elenco: Ben Kingsley, Joe Mantegna, Joan Allen, Laurence Fishburne e um garoto com cara de prodígio (portanto perfeito para o papel): Max Pomeranc. Tem também a participação, rápida, dos sempres ótimos William H. Macy e Laura Linney. É uma homenagem ao xadrez, a Bobby Fischer na verdade. Os fãs vão gostar muito. Os demais, não sei. Eu sou jogador de xadrez e Fischer é o meu ídolo, de todos os tempos., portanto gostei muito. Ele era um gênio. Foi campeão dos EUA aos 14 anos (1957), Grande Mestre aos 16 anos e até os 19 ganhou todos os títulos no país. Em 1972, no Match do Século, decisão do Campeonato Mundial, na Islândia, contra Boris Spassky, acabou com uma hegemonia russa que já durava 35 anos, ao ganhar do russo já no 21º jogo, dispensando serem jogados os três jogos restantes da disputa programada para 24 partidas. O match foi transmitido para o mundo todo e recheado de ingredientes de tensão, “jogos de cena”, inclusive frutos do temperamento difícil de Fischer – reclamando da iluminação, da posição das cadeiras, do tabuleiro, das câmeras de TV etc. (método psicológico para vencer o russo, criticado por muitos). A guerra psicológica ocorreu desde o início, quando Fischer perdeu a primeira partida e não compareceu para jogar a segunda, provocando com isso as mais variadas reações, grande alarido e até a intervenção, no curso das partidas, em nome do patriotismo, de Henry Kissinger, em nome do Presidente americano. Imagine-se o que significou para a Guerra Fria tal vitória, 3 anos depois que os americanos haviam pisado na lua, na frente dos russos e sendo quebrada uma hegemonia. O mito de Fischer se consolidou com seu desaparecimento logo após aquela disputa, pouco depois de retornar aos EUA e recolher alguns louros da fama. Inclusive nem apareceu para defender o título em 1975 (voltando a ocorrer, então, a hegemonia russa por mais 25 anos, até no ano 2000 aparecer o indiano ANAND). Sumiu por 20 anos, desafiou novamente Spassky, ganhou de novo um match em 1992, envolveu-se em polêmicas, chegou a ser preso e desapareceu novamente. Ninguém sabe direito até hoje os motivos dos desaparecimentos: teria ficado com medo de um fracasso após estar no topo do mundo? Teria ficado insano? Só se sabe que Fischer, já mais velho, acabou voltando para a mesma Reykjavic que testemunhou o final da hegemonia russa no xadrez (e a vitória de um gabola que um ano anos afirmava que era o melhor do mundo e que faria aquilo) e que acabou vendo-o morrer em janeiro de 2008, naturalizado islandês e deixando milhões de fãs pelo mundo todo, fascinados pelo seu jogo criativo, inteligente e agressivo e também com toda a aura mítica que o envolve. Fischer tinha um dom especial, uma memória prodigiosa e unia seu talento natural com a dedicação obsessiva, compulsiva ao xadrez. Este filme é uma homenagem a ele, inclusive pincelando ao longo da exibição momentos de sua vida, com filmagens da vida real. E embora o filme aparentemente trate apenas de mostrar a vida de um outro prodígio (como os EUA sendo celeiro eventual de prodígios no xadrez…) – pois baseado na vida real -, possui temas muito interessantes e sérios em seu desenrolar, como a obsessão pela vitória e a prisão que isso acarreta, a limitação que o xadrez (visando à vitória) acarreta na vida rotineira e seus efeitos na família e na vida social; o interessante confronto entre o xadrez de rua (aquele jogado nas praças e ultra-rápido) e o xadrez das escolas (ensinado pelos doutos e envolvendo estudos de técnica, posicionais etc.). Como eu disse, para os fãs é um prato cheio. Mas quem não é enxadrista pode até gostar bastante e quem sabe se interessar pelo jogo-arte-ciência. 8,7