CIDADE DE DEUS

Uma obra magistral, provavelmente o melhor filme nacional de todos os tempos, fato confirmado pelo público e crítica que o aclama permanentemente e pelos prêmios e indicações que recebeu, nas mais diversas categorias, principalmente nas de filme, direção, roteiro, edição, direção de arte, som e fotografia (Globo de Ouro, Havana, Cartagena etc); ganhou o Bafta na categoria de montagem e o WGA Awards, americano, na de melhor roteiro. Foi indicado ao Oscar de 2004 nas categorias de Roteiro adaptado, Fotografia, Montagem e Direção, mas era o ano de O senhor dos aneis. Entretanto, houve uma polêmica no ano anterior, quando o filme deveria ter sido escolhido para representar o Brasil na categoria de Filme estrangeiro: ocorreu um boicote de parte conservadora dos votantes e o filme deixou de ser indicado. Consta que alguns até se retiraram da sala, em protesto pelas cenas fortes e de violência, razão pela qual os americanos tentaram reparar a injustiça nominando o filme no ano seguinte. Pelo que consta, este é o segundo filme estrangeiro fora do eixo de Hollywood mais visto no mundo todo, perdendo apenas para Os intocáveis e O fabuloso destino de Amélie Poulain (franceses). Mas é um filme realmente de extraordinária realização: envolvente, emocionante, inteligente, dinâmico, com imagens de grandes efeitos, belos e artísticos enquadramentos de câmeras, um ritmo intenso e um trabalho perfeito de direção, edição e interpretação, além de ótimos som e fotografia. A consecução desse trabalho de alta qualidade certamente exigiu grande esforço, muito talento e sensibilidade e técnica, em suma, um belo fôlego, embora não seja recomendável para todo tipo de público, justamente em razão de sua violência, compatível com o realismo do tema (a cena com os moleques é uma das mais chocantes do cinema e pouquíssimo digestiva para muitas pessoas, incluídos os já referidos membros da Academia do Oscar). O filme retrata com maestria e arte os dramas das drogas e da miséria, em outras palavras, o mundo da criminalidade em uma comunidade da Zona Oeste carioca, que tem o mesmo nome do filme. Ali reina a rivalidade entre gangues e os chefões que comandam o tráfico, o que gera uma violência desmedida que a qualquer momento pode se manifestar e tensão contínua, em um meio perigoso pela própria natureza, onde as crianças desde cedo já andam armadas e com princípios bem diversos dos ideais infantis ou adolescentes. O filme é adrenalina pura e nos prende na cadeira do início ao fim, tendo um desenvolvimento bem coordenado e que não apresenta excessos no belo roteiro que contém sua visceral mensagem. Forte, empolgante, marcante, inclusive em sua excelente trilha sonora, com músicas de Seu Jorge, que inclusive atua muitíssimo bem (como Mané Galinha), Cartola, Raul Seixas, Tim Maia, Candeia, Luiz Melodia, entre outros e também músicas internacionais de variados ritmos, com destaque para os embalos fortes de “Dance across the floor” (Harry Wayne Casey e Ronald Finchs) e “Kung fu fighting” (Carl Douglas). Quanto ao elenco, é de nível elevado, sem exceção, incluindo os jovens e crianças, mas sendo destaques entre os adultos Alexandre Rodrigues (Buscapé), Leandro Firmino (Zé Pequeno), Matheus Nachtergaele (Sandro Cenoura) e Alice Braga (Angélica). O roteiro é adaptado do livro homônimo escrito em 1997 por Paulo Lins. A direção, de Fernando Meireles, assessorado por Kátia Lund. Até o título do filme e seu cartaz não merecem qualquer crítica, assim como a criativa cena da galinha, que inicia o filme e dá cores ao seu desfecho. Enfim, uma obra perfeita e com lugar definitivo na história do cinema. 10,0