PIG

Um filme diferente, surpreendente, com uma delicadeza revestida de rudeza e que merece atenção, porque traz algumas lições importantes, relacionadas com nosso papel no mundo, com o valor que tem cada indivíduo, com o pouco necessário para sermos felizes e com a necessidade de não se viver “jogando para a torcida”, entre outras, propiciando também algumas reflexões: na conversa de Robin com o menininho, por exemplo, podemos nos perguntar “que fim levou a árvore da nossa infância”? O filme já começa interessante, mostrando um belíssimo e ativo rio e um ermitão, que habita uma cabana onde o possível apego à ordem e à limpeza já deve ter desaparecido há muitos e muitos anos. Esse eremita, muitíssimo bem interpretado por Nicolas Cage (uma atuação memorável, inclusive), vai aos poucos sendo desvendado ante nosso olhar. Com o passar do filme receberemos pistas de quem ele foi verdadeiramente e por que motivos se isolou da civilização (a fita cassete já parece desvendar esse mistério). Mas vamos, sem dúvidas, percebendo que ele já foi alguém importante. O fato é que já de início constatamos que é um homem que se afastou do mundo, que tem um singular animal de estimação, do sexo feminino e que o ajuda a se sustentar financeiramente. E que suas relações humanas se limitam aos contatos semanais com o bem vestido e rico jovem, apreciador de músicas clássicas (que inclusive emprestam força ao roteiro) e que compra as trufas que a “girl” localiza nos subterrâneos da floresta. Essa iguaria, na verdade, é um elemento da gastronomia, que vai se revelar como tema também fundamental e que já percebemos assim pelo título requintado dos vários capítulos do filme, todos relacionados com a alta culinária; o primeiro, por exemplo, é “Tarte rústica de cogumelos”. E assim por diante. Trata-se de um filme, na verdade, com temas antigos, mas roupagem nova, embora essa forma possa sem sustos enquadrá-lo na categoria dos filmes “de arte”, portanto não adequado a todos os gostos. Assim, sendo escrito e dirigido por Michael Sarnaski, ao mesmo tempo em que passa a sua mensagem do essencial para a felicidade, homenageia a gastronomia e os grandes cheffs e o faz com bastante sensibilidade, apresentando momentos bem dosados de ação em meio a uma aparente placidez: a cena tragi-cômica da conversa entre o protagonista e o chefe de cozinha na mesa do restaurante é em vários aspectos avassaladora. Mas a do jantar (um resgate e uma grande ideia!) na casa do pai de Amir (personagem de Alex Wolff) é comovente e significativa, evocando um famoso jantar inesquecível, que mais uma vez enaltece Rob e a própria gastronomia como poderosa fonte cultural e sensorial. E a memória. Um filme que conforme o momento e o espectador vai produzir efeitos talvez inesperados. Inclusive pela tocante cena final, embalada pela voz, pelo violão e pelas intensas recordações. E quem o apreciar, como as iguarias que celebra, certamente vai reconhecer seus méritos como uma obra diferenciada ou pelo menos algo bem acima da média e que merece ser apreciado como um trabalho original e de respeito. 8,8