ANORA

Este é um filme que deve ser saboreado aos poucos, com toda a atenção e sem preconceito. Vê-lo com pressa ou aversão pode dar a falsa impressão de ser algo sem qualidade, até mesmo uma espécie de pornografia disfarçada em filme mais sério. Entretanto não é assim. Seu ambiente e matéria-prima é que exige total sensibilidade do espectador, pois a protagonista é daquelas garotas que trabalham em dancings, que executam números topless para os clientes, realizam malabarismos sensuais no pole dance etc e, por outro lado, também faz parte do enredo o crime organizado. Dois temas pesados e o primeiro certamente mais incômodo, principalmente pelo realismo das cenas eróticas, realismo, aliás, que permeia todo o roteiro, tornando a maioria dos fatos e cenas absolutamente verossímeis. Mas tudo é meio inesperado e segue diversos caminhos, pelos quais os personagens inclusive vão se expondo aos poucos porém integralmente, o que torna a situações dramaticamente bastante curiosas ou atraentes. Há, de fato, cenas que poderiam ser menos longas, outras que parecem forjadas para atrair audiência, mas no todo o conjunto é agradável, bastante harmônico e de considerável nível. Além do fato de o elenco ser ótimo, assim como o roteiro e a direção que pertencem a Sean Baker (premiado e indicado repetidamente em festivais de cinema, sendo ele recente vencedor do prêmio do sindicato dos diretores de Hollywood – DGA Awards). Por outro lado, a atriz Mikei Madison desempenha com muito talento e competência um papel extremamente difícil e desafiador – tanto, que está sendo indicada a melhor atriz em todas as premiações do cinema, incluindo o eminente Oscar e o Bafta (Oscar britânico, de hoje à tarde, dia 16/02/25) e também atua muitíssimo bem o russo Yura Borisov (Compartimento número 6), que constrói um personagem fundamental na história e também está sendo indicado a melhor ator coadjuvante nos mais diversos eventos cinematográficos. Vencedor da Palma de Ouro em Cannes e do Producer´s Guild Awards (prêmio dos produtores de Hollywood), este filme talvez não tenha o pedigree necessário para ganhar um Oscar, inclusive considerando o perfil dos votantes, mas é algo diferenciado, certamente acima da média, muito bem construído e realizado e tem uma desfecho que é um primor: a última cena, tocante, pungente e maravilhosa em significados, certamente passa a se agregar às dos melhores finais que o cinema já produziu. 9,0

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