A VINGANÇA DE ULZANA (ULZANA´S RAID)

O americano Robert Aldrich, que passou a ser famoso em 1954 quando dirigiu “Vera Cruz”, entregou ao cinema grandes obras, como “A morte num beijo”, “O que terá acontecido a Baby Jane?”, “Com a maldade na alma”, “O voo da Fênix”, “Os doze condenados”. E em 1972 dirigiu este western atípico, rodado no Arizona e em Nevada, elegendo como protagonista o mesmo Burt Lancaster do filme de 1954. Este faroeste aparentemente é o típico “cavalaria x índios”, com muita ação, violência, perseguições etc, tudo aquilo que vemos na maior parte dos filmes desse gênero. Entretanto, vai muito além do simples entretenimento, passando mensagens implícitas ou paralelas muitíssimo mais profundas e que acabaram sendo reveladas ou desvendadas algum tempo depois de sua exibição, assumindo alta relevância até para os próprios Estados Unidos. Aliás, contam que esse conteúdo alegórico foi o motivo pelo qual Burt Lancaster aceitou fazer o filme, cujo belo e premiado roteiro foi escrito pelo famoso Alan Sharp, uma vez que Lancaster era ferrenho defensor dos direitos humanos e – agora a razão oculta – era totalmente contra a permanência dos americanos no Vietnã, posição compartilhada por boa parte da população dos EUA. Por incrível que pareça, a conclusão da crítica e mesmo dos estudiosos em política e próximos do governo Nixon, foi de que este filme acabou realmente tendo influência na decisão do governo americano, de retirar as tropas do Vietnã a partir de 1973, o que o elevou a um patamar muito acima de um mero faroeste! Isso porque o roteiro muito bem construído, que inicialmente elege os temidos Apaches (Chiricahuas) como inimigos sanguinários, estupradores e assassinos, aos poucos tenta expor não apenas a cultura e as crenças apaches (com os motivos pelos quais matavam todos os brancos que encontravam pela frente), mas também justificar de certo modo suas criminosas ações em nome dos 20 milhões de indígenas que foram exterminados nas batalhas com os brancos. A partir de certo trecho e com leve base em fatos reais, o filme mostra os apaches não como tolos que ficam correndo em volta de uma carroça para serem mortos, progressivamente, a tiros, mas como astutos estrategistas (inclusive com o uso de binóculos e táticas engenhosas) e que praticavam atos com inteligência e previam consequências por meio de diversas armadilhas nas quais geralmente os soldados caíam. Com isso obrigando ao raciocínio o comboio dos brancos. Nesse sentido, o filme tem vários instantes com a prática de estratégia de um lado e de contra-estratégia do outro, no embate entre os soldados de um grupo de cavalaria e o bando de índios que fugiu da reserva e passou a exterminar inimigos. E justamente por essa conduta ardilosa no “campo de luta” é que implicitamente a Guerra do Vietnã soou como absolutamente impossível de ser vencida pela América, haja vista as táticas de guerrilha praticadas pelos vietcongues. Todos compreenderam que perder a guerra era questão de tempo e de mais vidas serem ceifadas. Eis a mensagem do filme e que ao mesmo tempo choca e faz pensar: é horrível constatar os métodos cruéis aplicados pelos apaches, mas de outro lado também não há como se esquecer da morte (ou assassinato em alguns casos) de nações indígenas inteiras. Belíssima fotografia, poderosa atuação de Lancaster e também muito bem todo o elenco, com destaque para Bruce Davison, para os mexicanos Jorge Luke e para Joaquin Martinez e Richard Jaeckel. Em tempo: a inteligência e a sutileza do filme se revelam em várias cenas, porém é marcante e irônica aquela em que o famoso “toque” de corneta da cavalaria (sinal clichê de ataque ou carga e que anuncia sua chegada “heroica”) é criticado, sob o argumento de no caso ter sido simplesmente um alerta para afugentar o inimigo ! Um filme importante, portanto, mas que mesmo se não tivesse a referida mensagem das entre linhas, ainda assim seria um western acima da média. 8,9

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