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REBECCA

Um filme de 1940, em preto e branco (o que reforça muito todo o seu “clima”), dirigido por Alfred Hitchcock (em seu primeiro projeto norte-americano), o que já era um diferencial. Basta se assistir à versão atual de Rebecca, para se sentir as diferenças (anos-luz) de direção, edição e até de interpretação e de roteiro, embora as histórias sejam praticamente idênticas. Não que a versão atual da Neflix seja totalmente ruim. Desde que não haja comparação, poderá ser palatável. Se houver comparação, o remake poderá soar como totalmente superficial e insípido. Inclusive a parte mais memorável do filme, que é a parte final, com o suspense mais intenso e as grandes surpresas, é incomparavelmente melhor aqui do que na versão de 2020, embora eu goste muito da atriz Lily James e da Kristin Scott-Thomas (que achei, porém, muito exagerada e caricata na versão recente). O elenco aqui tem George Sanders, Leo G. Carrel (em pequeno papel), mas é realmente comandado por Laurence Olivier e Joan Fontaine –em seu primeiro papel no cinema- e o filme tem ainda ótimo ritmo, excelente clima de suspense e também fotografia, sendo uma das inúmeras produções de sucesso de David O. Selznick, produtor que efetivamente interferia nas filmagens do que produzia, com um ego enorme a ser administrado -o que aqui não deve ter sido fácil, porque Hitchcock também não abria mão de dar seu cunho pessoal ao que estava sob sua batuta. O filme ganhou o Oscar 1941 de Melhor filme e Melhor fotografia, tendo concorrido aos prêmios de melhor  ator (Olivier), atriz (Joan) e atriz coadjuvante (Judith Anderson, a sombria/sinistra governanta), além de roteiro, trilha sonora, edição e direção de arte. Conta a história que várias atrizes se candidataram para o papel da protagonista, sendo uma delas a famosa Vivien Leigh (E o vento levou, de um ano antes). Como ela foi recusada e era a namorada de Laurence Olivier, dizem que o ator tratou Joan Fontaine com muita frieza durante todo o desenrolar da filmagem, o que segundo Hitchcock foi ótimo, porque a ideia era justamente essa: a personagem se sentir deslocada. Também contam que a partir daí o diretor instruiu todo o elenco a fazer o mesmo com a atriz. O filme é bastante fiel ao livro da famosa escritora Daphne du Maurier (exceto  quanto às restrições do famoso Código Hays de 1930 – autocensura em filmes) e aqui vem outra história: a de que essa autora teria plagiado o livro A sucessora, escrito em 1934 pela carioca Carolina Nabuco, filha de Joaquim Nabuco. O que se sabe de mais concreto (embora haja muitas coincidências nas duas obras!) é que Carolina enviou a partir de 1934 várias edições da obra, em inglês, a diversos agentes literários dos EUA e da Inglaterra, sendo um desses agentes coincidentemente o mesmo agente literário de Du Maurier. Seja como for, o filme tem pouquíssimas fraquezas e é considerado um dos melhores Hitchcock, apesar da adaptação do escritor ao estilo, que não era exatamente o seu.  Falando em estilo, Hitchcock aparece também neste filme, como sua marca registrada: rapidamente, quase imperceptível, de chapéu, atrás do personagem de George Sanders quando conversa com o guarda (após sair da cabine telefônica, aos 127 minutos de filme, mais ou menos). Por fim: eu me recuso, solenemente e por razões óbvias, a acrescentar ao nome do filme o subtítulo comercial “Uma mulher inesquecível”!  8,8