O ÚLTIMO PISTOLEIRO (THE SHOOTIST)

Este western de 1976 não é só diferente pela época em que foi feito e estrelado por John Wayne, astro do gênero a partir de 1930 com dezenas e dezenas de filmes, como No tempo das diligências, Rio bravo, El dorado, Rastros de ódio, Rio vermelho, Onde começa o inferno, Bravura indômita, O homem que matou o facínora. Sem deixar de ser interessante e sensível, é diferente também no seu tema e na ação, que não deixa de acontecer, mas não na mesma intensidade dos westerns convencionais: a começar pela época da história, é algo mais melancólico e existencial do que outra coisa, embora conte partes importantes da vida e do espírito dos pistoleiros, além de narrar os mitos que sempre os cercaram. A época referida é o início do século 20, precisamente 1901, quando o Oeste já começava a se tornar mais civilizado, embora o revólver ainda fosse usado como símbolo de segurança e valentia: era um tempo em que a selvageria já estava sendo domesticada, com o surgimento da luz, da água encanada, da pavimentação nas ruas, do telefone e se anunciava para breve o bonde elétrico: no filme vemos o bondinho já nos trilhos, mas sob tração animal (um cavalo); também aparece um automóvel, mas Henry Ford ainda não começara a produzir em escala. Nesse panorama, os fatos se passam na cidade de Carson City (Nevada) e são contados sem embaraços e com um andamento bem adequado. John Wayne, lenda do gênero (embora tenha feito vários filmes de outros tipos), tinha na época 69 anos e faleceria 3 anos depois, ironicamente pela mesma doença de seu personagem J.B.Books. O fato de ter sido seu último faroeste confirma a surpreendente propriedade do nome em português, quando o original significa “grande atirador” ou, no contexto do Velho Oeste, “pistoleiro de notável habilidade”. A atuação de Wayne é carregada de toda empatia e charme pessoais, mas também oriundos da experiência acumulada, embora debilitado em sua saúde (difícil distinguir em algumas cenas o que era real e o que era interpretação): e encontrou aqui perfeita sintonia com a excelente Lauren Bacall, então com 52 anos e muitos filmes, com destaque havia 30 anos antes com “À beira do abismo”, onde contracenou com o então marido, o grande Humphrey Bogart (o casamento durou de 1945 a 1957). O filho da personagem de Bacall aqui foi interpretado pelo jovem Ron Howard, que já havia iniciado há anos como ator, mas que viria mais tarde ser um notável diretor, com obras como Apolo 13, Uma mente brilhante e O Código Da Vinci Outro grande nome presente no filme é o de James Stewart, em papel pequeno, mas vê-lo é sempre muito agradável, sendo sem dúvidas um dos maiores atores da história do cinema (tinha 68 anos na época). O filme também traz o veterano e quase sessentão Richard Boone (Hombre, Hec Hamsey) e, por fim, também em papel modesto, mas com seu traquejo habitual, Scatman Crothes, cantor, dançarino, músico e dublador e que se tornou mais conhecido ao atuar no filme “O iluminado”, com Jack Nicholson. E todo esse conjunto funciona perfeitamente e no ritmo exato igualmente graças à segura e sensível direção de Don Siegel, que faz um filme leve, redondo, emocionante, com tensão e senso de humor nas medidas certas mas também profundidade nos temas mais importantes. O diretor na verdade já era famoso na época, principalmente na condução de diversos filmes de Clint Eastwood (Meu nome é Coogan, Os abutres têm fome, Perversa paixão, O perseguidor implacável). Um filme bastante prazeroso (embora alguns momentos tristes) e com a marca indelével de ser o trabalho de despedida do imortal John Wayne. 9,3

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