O MERCADOR DE ALMAS (THE LONG HOT SUMMER)

O título ridículo em português que foi dado a este filme de 1958 entra para a galeria das “bizarrices dos exibidores”, não tendo qualquer explicação ou sentido. O título original é óbvia e absolutamente pertinente e coincide com o da bela música que embala o seu início, quando vemos navegar uma barca no Mississipi e que dará origem a toda a trama, baseada, na realidade, em várias histórias e contos do famoso escritor americano William Faulkner (1897-1962) e não em apenas uma obra. Se olharmos apenas para o lado da originalidade, o filme talvez mereça algumas críticas, pois apresenta um enredo sem grandes novidades e seus tipos são aqueles repetidos à exaustão, em diversos filmes que retratam personagens sulistas dos EUA (inclusive havendo alguns sotaques “forçados” nesse sentido, inclusive de Orson Welles). Entretanto, apreciando a obra por alguns de seus encantos e sob o enfoque da diversão e dos bons tempos do cinema de histórias belas e dramáticas, pode perfeitamente ser incluído na categoria dos “filmaços” de antigamente. Pelo prazo que vê-lo nos proporciona.  A fotografia e a linda trilha sonora são de primeira qualidade, tendo o filme um belo colorido e uma ótima dinâmica, além da beleza das locações e do elenco, principalmente Lee Remick (linda, com seus 23 anos e em seu segundo filme), Joanne Woodward (com 28 anos) e Paul Newman (com 33 anos e conhecido na época como “Apolo”), que naturalmente deveria ter no contrato uma cena obrigatória em que aparece sem camisa (como outros galãs nos tempos atuais…). Mas o elenco não é só belo, como competente, também integrado por Angela Lansbury, Anthony Franciosa, Richard Anderson (que viria a ser na TV o chefe do Homem dos seis milhões de dólares e da Mulher biônica), embora o nome forte, o furacão, tivesse o nome de Orson Welles. A força física e interpretativa desse ator é algo impressionante e fora de discussões! Conta-se inclusive que foram grandes os problemas na produção, originados pelo temperamento do ator, principalmente ao se opor às ideias do diretor Martin Ritt (que ficou anos “de castigo” e sem trabalhar, por ter sido colocado na lista do Macartismo) e à conduta das “estrelas” de formação no Actors Studio e que por esse motivo tinham um estilo específico de interpretação (Stanislawski), caso de Newman, Woodward e Franciosa. Dizem também que houve um incidente entre o diretor e Welles, pelo qual este foi levado por aquele até um local ermo e lá deixado, tendo que voltar a pé o longo caminho, como castigo pelo seu comportamento e rebeldia…Mas, verdadeiras ou não essas histórias paralelas, não há dúvidas de que quando Welles entra em cena faíscas aparecem (no bom sentido da força de atuação), havendo ótimos momentos dele inclusive com as filhas e com Ben, o personagem de Newman: realmente sendo prazeroso ver Orson Welles e Paul Newman contracenando, instantes efetivamente marcantes do cinema. Também merece destaque o belíssimo (e tocante) discurso de Joanna no pic-nic forçado (sorteado) com Ben. O filme concorreu à Palma de Ouro em Cannes de 1958 e Paul Newman ganhou o prêmio de melhor ator. Sobre ele e os bastidores, foi logo depois que as filmagens terminaram e antes da estreia mundial do filme, que se casou com Joane Woodward, que seria sua companheira por 50 anos, até a morte de Paul. Interessante notar, mais para o final do filme, que as cenas entre os dois personagens parecem denotar nas “entrelinhas” o romance que havia na vida real. O final do filme poderia ser melhor, é certo, mas o conjunto todo vai agradar em cheio os mais diversos públicos, principalmente se confrontado com a pobreza que reina atualmente em nossos cinemas. Com equilibradas doses de ação, suspense, romantismo, humor, sensualidade e uma leveza típica dos filmes da época, uma ótima diversão. 8,8