O BOM PROFESSOR (PAS DE VAGUES)

O cinema apresentou, ao longo da história, inúmeros filmes focalizando o mundo escolar, principalmente o difícil relacionamento entre professor e alunos (os indisciplinados, revoltados ou até marginais). Talvez o mais famoso deles tenha sido “Ao mestre com carinho”, com Sidney Poitier, de 1967, cuja música também fez um enorme sucesso (com Lulu, “To sir with love”). Mas a maior parte desses filmes sempre adotou tons leves ou moderados para abordar o tema e no final das contas o final feliz sempre acabou prevalecendo (o impasse resolvido, os maus alunos se redimindo de seus atos, o bem vencendo o mal). Filmes realistas sobre a temática foram poucos, mesmo no mundo contemporâneo, onde existe o tal “politicamente correto” e impera a “indústria” do dano moral. Este filme francês, participante do Festival Varilux de 2024, entretanto, foge completamente à regra dos conflitos romanceados e lança luzes diferenciadas sobre tais questões. Aqui o realismo é levado muito a sério e o que vemos não apenas reflete uma realidade, como efetivamente nos deixa incomodados ao acompanhar os fatos e notadamente a reação do protagonista (ou, no caso, a “não-reação”). Nos sentimos desconfortáveis em muitas cenas, com as situações, plausíveis, sendo expostas de uma forma honesta e extremamente competente, tanto pela mão firme do diretor Teddy Lussi-Modeste, como pelo harmonioso elenco, comandado de forma marcante por François Civil, que constrói um personagem tão forte, quanto corajoso, coerente e íntegro e por esse motivo fascinante. De se observar que o título original do filme soa irônico, porque “pas de vagues” significa literalmente “sem ondas”, mas a expressão é utilizada para significar “sem problemas”, “sem confusão”, “sem atritos”, “na paz”. Este filme tem sido bastante questionado e criticado, por supostamente ter deixado de explorar um vasto campo que estaria à sua disposição, principalmente se fossem outros os caminhos do roteiro e a reação do professor aos fatos. Eu penso que no caso o professor Julian demonstrou suficientes áreas cinzas e reticências e o tempo todo adotou uma postura perfeitamente plausível de ser seguida, não cabendo ao espectador exigir determinado comportamento ou reação de um personagem construído aos moldes de seu autor, até porque diante dos mesmos fatos, são múltiplas as reações das pessoas, conforme sua visão pessoal das circunstâncias, seu temperamento, sua cultura, o contexto todo, enfim…Trata-se, em suma, de um filme de valor, impactante e diferenciado em relação à grande maioria e que já tratou desse sempre atual tema. 9,0