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THE EICHMANN SHOW

l_4163668_7b97d00dAdolf Eichmann, após se esconder por quinze anos na Argentina, foi capturado e encaminhado para Israel, onde em 1961 foi julgado por crimes contra a humanidade, acusado de executar o plano nazista de extermínio de seis milhões de judeus na segunda guerra mundial (entre 1936 e 1945). O chamado “julgamento do século” foi transmitido por rádio e TV e as fitas com as filmagens diárias eram encaminhadas para as mais variadas partes do mundo, pela primeira vez havendo uma cobertura jornalística com tal repercussão – passando o julgamento em alguns países em episódios diários de televisão – e pela primeira vez também sendo abordado o tema do holocausto. Este filme é original ao mostrar os fatos a partir do enfoque da equipe de filmagem, tendo sido especialmente contratado para dirigir essa equipe um famoso cineasta e documentarista americano, que inclusive fazia parte da famosa “lista negra” do senador Mc Carthy: Leo Hurwitz, muito bem interpretado pelo veterano ator Antonhy LaPaglia. O filme aborda desde as dificuldades de se obter permissão dos juízes para a cobertura do julgamento pela televisão, até os efeitos que o dia a dia dos depoimentos das testemunhas vai provocando na população (cuja maioria ignorava os detalhes das barbaridades nazistas) e principalmente na própria equipe. O produtor que contratou Hurwitz, interpretado por Martin Freeman, foi um dos sobreviventes de Auschwitz, assim como muitos dentre os 112 que prestaram depoimento no tribunal. Foi um momento histórico, pois Israel teve a chance de mostrar e provar ao mundo as atrocidades cometidas contra os judeus, nas quais muitos sequer acreditavam. Curioso o filme também mostrar que, apesar da importância do julgamento, havia outros dois assuntos na época, de interesse mundial, e que acabaram também atraindo as audiências de televisão: a ida ao espaço do russo Gagarin e a invasão da Baía dos Porcos em Cuba. Mas talvez um dos enfoques mais interessantes seja o da obsessão de Hurwitz – fazendo um certo “estudo do mal” -, em tentar flagrar no acusado algum indício de humanidade. O filme é enriquecido com muitas imagens do próprio julgamento e da chocante realidade dos campos de concentração, o que certamente provocará muita indignação e sem dúvida emoção.  7,8

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O ANO MAIS VIOLENTO (A MOST VIOLENT YEAR)

urlUm filme diferente e classudo. Tanto ao tratar do tema, como nas sutilezas do enfoque. Drama envolvendo um imigrante/empresário bem sucedido (com origem escusa do negócio???), dono de uma frota de caminhões-tanque e que são alvo de assaltos constantes, suspeitamente pelos concorrentes.  Mas ele tenta manter os negócios distantes da ilegalidade e da fiscalização da polícia e sobreviver. Em suma, tenta não ser um gangster, não sucumbir à corrupção e esse é o enfoque do filme que contempla o início dos anos 80, todo um sistema instalado e funcionando por trás da lei, com a procuradoria investigando e ainda sendo Abel casado com a filha de um mafioso, interpretada pela ótima e sempre sensual Jessica Chastain. O ritmo do filme é lento, sem muitas cenas de ação (como é costumeiro), mas denso, com um roteiro encorpado e diferenciado dentro do gênero: na verdade, a habilidade do diretor J.C. Chandor tem grande mérito nessa densidade e no suspense e interesse que o filme oferece. O personagem principal é otimamente desempenhado pelo ator Oscar Isaac. Um dos pontos positivos do filme é a cena da perseguição do caminhão roubado: mas na sequência vem o único ponto negativo, que é o inverossímil estado físico do personagem, que mesmo após correr centenas de metros atrás do gatuno, não aparenta qualquer cansaço ao entrar do vagão do metrô(sequer ofega!). Mas, de resto, tudo muito lógico e instigante e o filme no final deixa uma mensagem sobre a corrupção e seus rastros impiedosos: a cena cruel do fechamento mostra a impotência diante do rolo compressor que passa indiferente por sobre o que estiver no seu caminho. Mesmo sobre o que é decente. 8,0

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A FAMÍLIA BÉLIER

590648.jpg-r_160_240-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxxA família Bélier mora numa propriedade rural não muito longe de Paris e poderia ser igual a muitas outras famílias francesas ou de outras partes do mundo…não fosse uma particularidade: tirando a filha Paula, são todos deficientes auditivos. A partir daí alguns fatos cotidianos – mas especialmente um deles – vão sustentar todo o roteiro e propiciar momentos ternos, engraçados, emocionantes, mas sem sentimentalismos baratos. Esta comédia francesa (co belga) tem o dom de ir nos amarrando aos poucos e de acabar nos fazendo reféns ao investir na emoção, mas com leveza, simplicidade e naturalidade, nos cativando também pelo geralmente feliz casamento do cinema com a música: no caso, belas composições principalmente de Michel Sardou, destacando-se a clássica – da música romântica francesa – Je vais t´aimer! Um filme para toda a família e que deixa no final os corações quentes e felizes, de sentimentos bons e que perduram depois que a sessão termina, fato que comprova seu mérito. Embora a premissa não seja original, a maneira como a história é contada realmente torna o filme encantador. Direção ótima de Eric Lartigau, elenco maravilhoso comandado por Louane Emera (jovem e ótima atriz já aos 18 anos), Karin Viard (bonita e veterana atriz francesa) e François Damiens (experiente ator belga, com um personagem exótico e interessante), mais uma pérola do cinema francês, que mostra o valor da família e os aparentes conflitos com a realidade da vida…a síndrome do ninho vazio…voar!  9,0

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NOITE SEM FIM (RUN ALL NIGHT)

RunAllNight_TeaserPosterMais um thriller com o ator que não se cansa de produzir e que já forjou um estilo próprio e carismático, sendo realmente um destaque: Liam Neeson é um diferencial neste filme policial que não é muito diferente das dezenas que são exibidos à exaustão. Mas outro diferencial é o excelente Ed Harris e há ainda alguns ingredientes a mais e interessantes: a direção/ritmo e os recursos não muito usuais de câmera (no gênero)…e o tema da paternidade! A esse respeito, ponto vital do filme é uma conversa, tensa e realista, entre os personagens dos dois atores acima, em uma mesa de restaurante! De resto, o trivial, perseguição de carros, tiros, submundo do crime e de quebra Vincent D´Onofrio e Nick Nolte, este em participação especial (tão breve – teve diversas cenas cortadas na edição final -, que seu nome nem aparece nos créditos!)…Mas pelos elementos acima (e uma boa dose de sentimentalistmo), é diversão garantida para quem aprecia filmes policiais de ação.  7,5

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KINGSMAN – SERVIÇO SECRETO

111.md (1)Muito divertido e a respeito cabe um aviso de início: trata-se de um filme de espionagem, mas uma comédia! Portanto, não é para ser levado a sério, é só para diversão pura. Com ironias (inclusive satirizando filmes supostamente sérios de espiões), exageros, muita ação, aventura, um filme de espionagem baseado em um famoso comic book. Extremamente bem cuidado e, como não poderia deixar de ser, anárquico: tem uma cena dentro de uma igreja que é antológica! Com Colin Firth e Samuel L. Jackson, ótimos como sempre! E a participação de Michael Caine, claro! O diretor é Matthew Vaugh, o mesmo de X Men e Kick-ass, entre outros, e naturalmente o filme é de produção inglesa (Reino Unido, na verdade).  7,7

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TRÊS CORAÇÕES (3 COEURS)

babacc1f59f75644bbf802438336d4eb6f487Um drama francês (co produção belgo-germânica) para adultos. O ator principal é Benoît Poelvoord, o mesmo do filme La place sur la terre. As atrizes são Chiara Mastroianni (Frango com ameixas, Augustine, Bastardos…) e Charlotte Gainsbourg, esta última uma atriz talhada para papéis estranhos e difíceis (basta dizer que fez Ninfomania I e II, Melancolia e Anticristo, entre outros). O filme também tem Catherine Deneuve. Um fato trivial, um desencontro, outro fato rotineiro e um impasse, uma coincidência inesperada, uma surpresa aterradora. Consequências são desencadeadas e vão produzir sentimentos ambíguos, dúvidas, segredos quase inconfessáveis, uma situação insólita e de difícil resolução. Deve-se seguir o coração, sempre, a qualquer preço? Um segredo pode ser mantido indefinidamente? A trilha sonora, nada usual em filmes desse gênero, torna a tensão quase insuportável e com ela só nos assaltam sentimentos de possível tragédia…no final fica uma questão que nos faz pensar sobre o destino… Cinema diferente e de qualidade, com as peculiaridades dos costumes franceses tornando as coisas mais atraentes. Mas não é para todos os paladares, porque lento, denso, e com diálogos econômicos, como, aliás, é típico do cinema francês.  7,8

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TICKLE READ – O MELHOR LUGAR DA TERRA (THE GREAT SEDUCTION)

La-gran-seduccion-poster_final.jpg_cmykUma comédia leve, muito simpática, com tipos que nos parecem sempre conhecidos e amigáveis e que se concentra em um pequeno porto na Costa do Canadá – embora pareça o litoral da Irlanda ou da Escócia. Os habitantes, ex-pescadores, recebem minguados subsídios do governo e têm a chance de novamente trabalhar e ganhar um salário. Mas a saída para a crise é a vinda, para a comunidade, de uma empresa de petróleo…entretanto, para que isso ocorra, uma grande farsa tem que ser montada, sendo essa a razão do título original: “A grande sedução”. Estrelado pelo ótimo Brendan Gleeson, é daqueles filmes simples, sem qualquer rebuscamento ou efeitos, mas que nos cativam pela história simples e de tipos humanos, com um final que emociona e que evoca o tema social sobre o qual  girou, afinal, todo o enredo. Nada muito profundo, mas um bom divertimento e que alcança seu tom certo pelos méritos da direção e do elenco. 7,5

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O SAL DA TERRA (THE SALT OF THE EARTH)

l_3674140_c63b0c17Não é a toa que esse documentário sobre a vida e a obra do fotógrafo social Sebastião Salgado abriu o Festival do Rio 2014, foi indicado ao Oscar 2015 de Melhor Documentário, recebeu o prêmio especial do júri, da seção “Um certo olhar” no Festival de Cannes 2014, e ganhou o César da categoria (o Oscar francês): é uma obra perfeita, realizada pelo filho dele, Juliano Ribeiro Salgado, e pelo festejado cineasta alemão Wim Wenders. Com a maior parte narrada pelo próprio Sebastião, dando colorido aos fatos ilustrados pelas maravilhosas/colossais fotografias – tiradas ao longo de vários projetos fotográficos, pelo mundo todo -, o filme começa com o impressionante relato (inclusive fotográfico!) de Serra Pelada e prossegue por diversos lugares do mundo, com enorme conteúdo poético e humano, mostrando muitos contrastes entre a beleza e os dramas humanos (o filme é tão belo, quanto pungente!). Tão densos e chocantes, que após cobrir por vários anos os fatos sociais na África (Etiópia, Ruanda, Mali…), o fotógrafo se recolheu por um tempo, totalmente abatido e desesperançado com os próprios seres humanos. O documentário é extremamente bem feito, em parte falado em francês (Salgado ficou mais de 10 anos longe do Brasil, na época da ditadura militar), dando a sensação de que não se poderia fazer nada melhor para contar a história de um homem idealista com a sensibilidade da fotografia correndo em suas veias: uma verdadeira radiografia, de sua obra e do alcance social da mesma (na visão também íntima do filho), tentando sensibilizar as pessoas e os governos para problemas de gravidade e interesse mundiais. Enaltecendo também a esposa Lélia, como valiosa colaboradora e organizadora dos trabalhos para fins de seleção e publicação (dos álbuns e das coleções), assim como peça vital quanto ao impulso criativo do marido, “Sal da terra” são as próprias pessoas que habitam o planeta e o filme realmente é  digno de Oscar, deixando no final, com o “Instituto Terra” e o impressionante reflorestamento realizado ao longo de mais de uma década, uma lição ecológica tão bela quanto fundamental, revestida com a esperança e a certeza de que por mais devastada que seja a natureza, é sempre possível recuperá-la, com amor, esforço e determinação. O título do documentário também é genial, tendo sido criado com o significado acima, mas também fazendo referência ao nome do homenageado. E como se extrai do próprio texto, testemunhamos aqui, para nosso orgulho de cidadãos e de brasileiros, um homem hoje com 71 anos e que sempre “foi movido pela empatia com a condição humana”, utilizando sua arte para espalhar importantes mensagens, em nobre missão de conteúdo humanitário! A nota dentro do gênero não pode ser outra:  10,0 

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CUT BANK

7QCCnbZUma daquelas pequenas joias e que passam despercebidas nos cinemas. Ou nem passam por eles. “Cut Bank” é o nome de uma pequena cidade localizada no Estado de Montana (não muito longe da fronteira com o Canadá), com cerca de 3 mil habitantes, onde nada acontece e tem como chamariz ser a cidade mais fria dos EUA. Lá tem um xerife, uma ou poucas igrejas, as crianças andam de bicicleta nas ruas de pouco movimento, todas as pessoas se conhecem – e não têm grandes perspectivas de futuro -, enfim, um perfil igual ao de muitas cidades que conhecemos ou vemos em filmes e aí é que reside o mérito do filme. Que mostra que com um bom roteiro, um bom diretor e um bom elenco não se precisa de efeitos especiais. Porque nesse contexto de aparente enfado e mesmice, fatos começam a ocorrer a partir de um evento (que seria o “primeiro assassinato” na cidade) e o drama pacato se transforma em um thriller muito interessante. O roteiro é excelente, o elenco perfeito e as pequenas engrenagens de um plano imperfeito passam a gerar consequências imprevisíveis e surpreendentes, como é o filme até o seu final. Algo diferente e inteligente, com direção de Matt Shakman (que dirigiu episódios de inúmeras séries americanas, entre as quais House, Revenge, The good wife, Mad men…) e um elenco poderoso, comandado por John Malkovich, Billy Bob Thornton e Bruce Dern, apresentando também Michael Stuhlbarg (Um homem comum)  em uma atuação memorável.  8,7

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ALL IS BY MY SIDE (JIMI: TUDO AO MEU FAVOR)

SOR_All-Is-By-My-SideUma boa biografia de Jimi Hendrix na vida adulta, do anonimato à fama, do mesmo diretor de 12 anos de escravidão (John Ridley). O ator não poderia ser melhor: Andre Benjamin está excelente. E o figurino e a reconstituição da época são perfeitos. O roteiro, porém, não é espetacular e tem algumas lacunas (o final poderia ser melhor, há uma personagem que some sem explicações e não vemos a inesquecível apresentação de Jimi no Monterey Pop Festival, no qual além de fazer, entre outras performances, a de tocar a guitarra com a língua, acabou colocando fogo no instrumento em pleno palco).  Mas a história mostra momentos importantes de um grande ícone da música: uma guitarra que, ao contrário de seu dono, tinha muito o que falar e que deixou até constrangido Eric Clapton, pelo menos é o que mostra uma cena do filme. E são impressionantes as referências musicais daquela época, entre outros os Rolling Stones, Beatles, The Who, Bob Dylan, Simon and Garfunkel, Janis Joplin… Interessante também saber que no início da carreira a namorada de Keith Richards foi importante na vida de Jimi, como também Chas, do grupo The Animals (que fez sucesso com The house of the rising sun), que acabou sendo o seu produtor/empresário. Mas o filme mostra que apesar de ser um som de guitarra que ficou na história, havia ali um talento em estado bruto, um temperamento quase selvagem, produto da origem pobre, das drogas, e da própria vida do show business: um roqueiro que, como os demais (na mensagem do filme), não conseguia se relacionar pessoalmente, como o fazia com as multidões.   7,7

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TIMBUKTU

timbuktu-posterOs que gostam de filmes de arte vão apreciar. Produzido pela França e Mauritânia, concorreu por este último país ao Oscar 2015 de Melhor filme estrangeiro (ganho por Ida), mas ganhou o Cesar (Oscar francês) de Melhor filme e Melhor diretor (Abderrahmane Sissako). No meio do deserto, uma região de Mali (país que fica ao noroeste da África) é dominada por fundamentalistas islâmicos, que ali passam a aplicar seus critérios e métodos de justiça, sempre em nome de Alá e do Profeta: entre outros, proibir a música, o futebol – em uma bela cena aparecem os jogadores em plena partida, mas sem a bola…-, obrigar as mulheres a usarem véus e luvas, dar chibatadas em quem contrariar suas regras etc., percorrendo armados, e alguns com o rosto coberto, todos os caminhos de areia e de placidez da paisagem de um minúsculo, pobre e inofensivo povoado, que afinal tem que se resignar com o destino que lhe é imposto, pela força e em nome daquilo em que os extremistas acreditam. E ali acontece uma tragédia específica, que acaba sendo o elemento central da história, a qual destaca, além da ignorância dos dois lados (em sentidos diferentes), o absurdo dos atos de dominação e até dos aparentes anacronismos e contrastes: o uso de celular no meio de um total despojamento material, por exemplo, o apedrejamento de um casal enterrado na areia enquanto um homem faz coreografias de balé… na verdade, são homens armados combatendo ovelhas…O mais assustador é a violência insensata sendo aplicada com argumentos de fanatismo religioso! Ver criaturas já aprisionadas pela religião, tornarem-se ainda mais cativas de quem interpreta essa religião a favor de suas arbitrárias ações, da intolerância. O terror se instala sem pedir licença e com ares de normalidade. Impressionante o diretor ter conseguido realizar um filme com tamanha objetividade, eloquência e perfeição técnica (som, a pungente mas discreta trilha sonora, a belíssima fotografia e os enquadramentos, o perfeito domínio do tempo – ou seja, da duração das cenas…). Nem parece que estamos diante de atores e sim de um documentário e as reticências da cena final são de um peso imenso. Uma mensagem clara, pungente e que infelizmente reflete o mundo atual, seus perigos e violência, seus absurdos e sua insensatez e, sobretudo, a incerteza quanto ao que virá.  8,5

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UNE NOUVELLE AMIE (THE NEW GIRLFRIEND)  

487904Um filme forte no tema, com algumas cenas fortes e que pode chocar os mais conservadores, dirigido por François Ozon (Jovem e bela, Dentro da casa…). Mas muito belo, por expor o que expõe e por provocar reflexões profundas, sobre nossos sentimentos e preconceitos. Recomendado para adultos, é, de fato, uma ótima ocasião para testarmos as nossas barreiras. Um tema complexo tratado de maneira realista, porém leve, delicada até. Mas sem perder a abrangência, que inclusive provoca indefinições, à medida em que os sentimentos vão aparecendo e se modificando. Excelente desempenho do par central: é o segundo filme que vejo com Anais Demoustier -e já virei fã – e embora tenha visto vários com Romain Duris, aqui se trata de um desempenho muito corajoso dele, realmente especial. Penso que é daqueles filmes que só o Cinema Francês sabe fazer, misturando habilmente drama, romance, sensualidade e expondo a sexualidade de uma forma absolutamente franca e sem pudores. Um momento especial é a cena da bela música Une femme avec toi, de grande significado. Perto do final, outra bela cena, extraordinária mesmo, no hotel Virgínia e que desencadeia um desfecho que alguns irão gostar e outros não. Entretanto, na cena final só haverá lugar para a emoção e para o reconhecimento de que se havia preconceito, pode ter dado lugar a outros sentimentos, bem mais nobres. No todo, um filme para não deixar ninguém indiferente e que revela a complexidade do ser humano, multifacetado inclusive quanto à noção exata dos seus limites e desejos.  8,5

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BIRD PEOPLE

l_2368635_2d8b1899Um filme contemporâneo, insólito e estranho. Porque de repente sai de uma visão normal e se torna simbólico, evocando liberdade e transformação, entre outras concepções, mas nos deixando confusos e atônitos. Principalmente no início o filme vai se desenrolando muito lentamente, parecendo perder tempo em detalhes que normalmente não interessam, mas como se para nos dizer que devemos parar e perceber muitas coisas ao nosso redor, talvez o que normalmente não faz parte do nosso foco, na correria do dia a dia (para alguns, o adjetivo poderia ser o de um filme “chato”). Mas de repente uma atitude imprevisível muda a direção das coisas e faz nascer algo. Um rompimento súbito, inesperado. E instantes depois, sem explicação, o realismo dá lugar à fantasia. Que é quando talvez se perceba que tudo pode ser leve, flutuando ao sabor da liberdade. A conexão se dá, por fim, e o filme termina nos deixando muitas interrogações. Mas o sentimento é de uma obra acabada e por isso deve ser tido como mérito essa sensação de estarmos vagando por caminhos onde a única certeza são os sentidos…e a experiência de repentinamente nos atirarmos ao desconhecido…Com Josh Charles (o Will de The good wife) e Anais Demoustier, produção francesa dirigida  por Pascale Ferran (diretora do ótimo Lady Chatterley, de 2006) e que participou da mostra Um certo olhar, em Cannes 2014.  7,8

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THE ABSENT ONE

facangyilkosok-film-2014-180A Dinamarca costuma fazer ótimos filmes. E certamente seus “policiais” estão entre os melhores do mundo. São filmes densos, fortes, realistas e que contam histórias de assassinatos com inteligência e reticências/segredos, o que deixa o espectador em permanente suspense, acompanhando as investigações. A ótima direção tem nos atores e personagens o seu grande mérito, tanto que este é um segundo filme envolvendo o Departamento Q (setor da polícia de Copenhague que investiga crimes arquivados): o primeiro foi Guardiões das causas perdidas/Departamento Q, tendo sido todos escritos por Jussi Adler-Olsen, também autor de Os homens que não amavam as mulheres. Trata-se de detetives de carne e osso e não estereotipados (como costumamos ver, por exemplo, no cinema americano): sem dúvida, o investigador Carl, policial obstinado, obsessivo e mal humorado é destaque quanto à atração e interesse desse thriller lançado internacionalmente no final de 2014.  8,5

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MAGICAL GIRL

l_3089326_f83d3bfeUm drama forte, estranho de início, lento (ou seja, não para todos os gostos) e que nos deixa em permanente suspense. Mais ainda por não serem claras as ligações de fatos e personagens e também por percebermos que por trás de tudo existe um propósito definido, por gente inteligente, sensível e criativa (o diretor e roteirista é Carlos Vermut). Aos poucos é que vamos entendendo as conexões, habilmente “costuradas”. E os desdobramentos são surpreendentes, sendo alguns verdadeiramente chocantes: o ser humano sempre multifacetado, sempre surpreendendo… E o filme tem passagens interessantíssimas: a cena do vômito, a da peça faltante do quebra-cabeças, a sutileza que envolve as duas cenas na mansão (os fatos ficam apenas sugeridos, deixando por conta da imaginação de cada um) e a do cartão com a palavra-chave na segunda visita…E a parte final é simplesmente espetacular, fechando o ciclo com chave de ouro. Em suma, um filme que tanto mantém nosso interesse, quanto desperta nossa curiosidade e admiração: cinema espanhol de alta qualidade e que foi vencedor da Concha de Ouro (Melhor filme) e da Concha de Prata (Melhor Diretor) no 62º Festival Internacional de San Sebastian 2014 . 8,7

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SEGREDOS DE UM CRIME (FELONY)

felonyNos últimos anos o cinema australiano evoluiu muito. Em diversos gêneros. Aqui a prova desse fato: um drama policial muito bem roteirizado, interpretado e dirigido. Os dilemas se formam e o suspense é bem montado em torno dos focos de tensão. A corrupção pode ter diversas facetas. A mentira encoberta é uma delas. E surge um questionamento: quando o castigo talvez não seja justo, ainda assim devem prevalecer a ética e a verdade? Com Joel Edgerton e o grande Tom Wilkinson, o filme (que teve co-produção americana) foi exibido no Festival de Toronto.  8,0

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CINDERELA

277077.jpg-r_160_240-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxxNo tempo em que o desenho da Disney fez aquele imenso sucesso, não existia a tecnologia adequada para tornar perfeitas, se fosse em filme, as cenas que exigiam efeitos, como, por exemplo, a transformação dos ratinhos em cavalos, da abóbora em carruagem e principalmente o reverso dessa transformação. Agora existe e de maneira espetacular. Mas não é só a imagem que torna esse filme encantador. A Disney optou por simplesmente transpor o desenho para a tela, como filme, não modernizando a história. É simplesmente a magia do conto de fadas transformada em filme, com toda a sua pureza e fantasia. É quase a mesma sensação de estarmos vendo o desenho, só que com personagens reais e na plenitude da beleza e dos efeitos especiais do cinema atual. Os atores são convincentes: a Cinderela é a adorável atriz Lily James (de Dawnton Abbey), o Príncipe é Richard Madden, igualmente com desempenho muito bom, os ótimos vilões são Cate Blanchett e Stellan Skarsgard e a fada madrinha Helena Bonham Carter. O diretor, Kenneth Branagh. Cabe uma crítica: a trilha sonora. As músicas originais –  notadamente a principal e a da fada madrinha – só tocam após terminar o filme, durante a exibição dos créditos. E é realmente uma pena, porque são muito bonitas e combinariam muito mais com a poesia toda. Possivelmente isso foi feito para atrair o público jovem. Mas acho que isso o próprio filme já faria, pois é tão belo quanto um conto de fadas…Agora, vale a pena esperar os “letreiros” terminarem, não só para ouvir as duas músicas, mas para ouvir a fala final da fala-madrinha, uma frase apenas, mas que vai arrancar risos pela inesperada originalidade.  8,0

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UNE PLACE SUR LA TERRE (A PLACE ON EARTH)

une-place-sur-la-terre_tNone_jpg_210x312_crop_upscale_q90Há filmes que nos despertam algo especial, um fascínio difícil de tornar palpável. Este é mais um filme francês para quem gosta de coisas especiais, enquadrável no gênero filme “de arte”. Porque foge do convencional e nos leva por caminhos que não sabemos onde vão dar, não sendo perceptíveis de imediato todos os seus meandros, que vão sendo construídos aos poucos. O começo já é muito interessante: um vizinho fotógrafo, uma pianista, uma interpretação eloquente na solidão da noite… Gosto do cinema francês porque trata de pessoas, de relações, de honestidade de atitudes, de despojamento material, mas também fala da vida e da arte. É algo que foge do trivial e também por isso extremamente atraente. Neste caso, quando o filme termina, o coração pode estar apertado, tomado de emoções fortes, mas indefinidas. E que vão durar por mais um bom tempo. É o valor da arte, pois não são todas as obras que nos provocam esses sentimentos. Talvez seja realmente um filme mais para se sentir do que para pensar… 8,5

 

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MAR NEGRO (BLACK SEA)

Black Sea PosterUma produção britânica, trazendo Jude Law em um papel bem diferente daqueles que costuma desempenhar: aqui ele é o capitão de um submarino, em uma missão nas profundezas do Mar Negro. Personagem que exige bastante do ator, não só pela dramaticidade da história envolvendo o submarino e a tripulação, como também o seu lado pessoal/familiar, que vai ter importância vital no final do filme. Um thriller, portanto com muita tensão e suspense, em um ótimo trabalho do ator e do restante do elenco, com direção de Kevin Macdonald. Não é um filme inesquecível, mas é muito bem realizado e tem um ritmo eletrizante que faz vale a pena a diversão. Inclusive porque em sua parte final não é fácil antecipar os acontecimentos, diante do rumo que as coisas tomam. O que torna o filme mais interessante ainda.  7,7

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BACKCOUNTRY

download (1)Já de início se anuncia que o filme (canadense) é baseado em fatos verdadeiros, o que já coloca nossa imaginação para funcionar. Trata-se de um casal que vai acampar e se aventurar nas trilhas de um parque ecológico na região de Ontário (com belíssimas e típicas paisagens). Importante: fora da temporada. Dizendo apenas isso, já podemos lembrar de alguns filmes com esse tema. Mas este se diferencia da grande maioria. Pela qualidade. Primeiro, o elenco é muito bom e isso também dá realismo às cenas. Segundo, o diretor também é ótimo. E terceiro – e principalmente -, o roteiro (com a trilha sonora, perfeita) vai criando uma tensão crescente e o suspense permanece até a última cena: não se sabe nem o quê nem quando vai acontecer alguma coisa. Nesse ponto, é essencial nada se saber previamente a respeito do filme (não ler a sinopse, portanto!).  Isso cria um clima quase insuportável em algumas cenas. Ajuda muito, para os corajosos, ver o filme no escuro e em total silêncio – com fone, melhor ainda. Interessante – outro mérito – é que o filme mantém a atenção/tensão mesmo quando ficamos conhecendo a natureza do perigo: que é exatamente quando o terror deixa de ser psicológico. E a partir dessa altura será exigido estômago forte para algumas cenas. Com poucas imperfeições, algo sem dúvidas muito atraente, notadamente para os fãs do gênero.  8,5