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MINHA VIDA EM MARTE

Depois de “Os homens são de Marte…e é para lá que eu vou”, de 2014, a diretora Susana Garcia repete a dupla e o gênero, mas aqui com uma maior inspiração: tanto de roteiro (baseado em obra pessoal da excelente Mônica Martelli, a protagonista), quanto de interpretação, basicamente pela extraordinária empatia entre a atriz citada e seu parceiro Paulo Gustavo, que tem um desempenho também espetacular, ambos compondo personagens engraçadíssimos e que provocam risos e gargalhadas o filme todo. Também trabalha no filme o ótimo ator Marcos Palmeira, que no caso faz o marido da personagem de Mônica. Na parte final do filme, uma surpresa no desenlace da história (pelo menos para mim) e também uma homenagem inesperada mas muito importante aos laços da amizade, comparados ao verdadeiro amor. Se fosse para apontar defeitos, poder-se-ia dizer que as “sacadas” constantes e inesgotáveis talvez cansem ou retirem espaço da trama ou do lado carente e feminino que poderiam ser mais desenvolvidos dentro da história de um relacionamento em crise, ou, ainda, que os personagens muito semelhantes com o ator e a atriz na vida real retirem deles um pouco do valor…mas são detalhes e que acabam se desvanecendo diante do conjunto da obra. Pois o fato é que é uma das melhores comédias brasileiras dos últimos anos (senão a melhor) e que tem o mérito de nos fazer rir a maior ou grande parte do filme, apresentando um ritmo ágil e um texto inteligente e criativo, o que não é nada pouco.  9,0

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UMA ENTREVISTA COM DEUS

Tendo coberto jornalisticamente a Guerra do Afeganistão e enfrentando também sérios problemas de relacionamento, o personagem interpretado por Brenton Thwaites (ator australiano, mais conhecido pela personificação de Dick Grayson na série Titans da DC comics) realiza uma pequena série de entrevistas com um homem misterioso que alega ser Deus (o excelente David Strathairn, de Boa Noite, boa sorte). A dupla entrega excelentes performances e os diálogos são realmente instigantes, polêmicos e corajosamente enfrentam questões difíceis, algumas transcendendo os tempos ao discutirem a existência ou inexistência da divindade, bem como a finalidade de tal existência diante do livre arbítrio. Diálogos rápidos, afiados, filosóficos… e circunscritos a eles – sem perder a vinculação, porém – os dramas do dia a dia, tudo despertando bastante atenção e prendendo definitivamente o espectador. Não é, talvez, uma abordagem tão aprofundada quanto poderia ser e o filme acaba fazendo algumas concessões quando se distancia do foco principal, mas sem dúvidas é uma obra subestimado, porque é muito mais interessante do que a cotação que tem recebido como média nos mais variados contextos (nota 5,7 no IMDB, por exemplo). 8,5

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GREEN BOOK

Baseado em fatos reais, este drama estadunidense concorreu a vários Globo de Ouro: Melhor filme musical/comédia, Melhor ator em filme musical/comédia (Viggo Mortensen), Melhor ator coadjuvante em filme musical/comédia (Mahershala Ali), Melhor diretor (Peter Farrelly) e Melhor roteiro. E ganhou o Globo de Ouro de filme, ator coadjuvante e roteiro! E Mahershala repetiu o prêmio no Critic´s Choice Awards! Dizem as más línguas que em razão de problemas políticos/ideológicos de seus realizadores, o filme vai ficar de fora do Oscar. Será um pena, porque tem grande qualidade. É praticamente um road movie, percorrendo grande parte dos EUA e enaltecendo sua cultura e suas belezas. E em meio a isso temos um pianista clássico conservador e um motorista contratado por ele, de origem italiana e sem qualquer compostura ou cerimônia, em uma convivência que vai naturalmente propiciar muitas trocas e recíproco aprendizado, além de quem sabe render uma boa amizade. O fato é que Viggo é a força-viva do filme e entrega uma interpretação estupenda, embora Mahershala por sua vez, comece tímido mas vá crescendo ao compor um personagem contido e difícil, mas que cresce assustadoramente e inclusive protagoniza uma das mais belas e tocantes cenas do filme (na chuva à beira do asfalto). Porque a época é de segregação e o racismo anda à solta nos anos 60. Tanto, que o título do filme se refere a um guia onde são catalogados hotéis e restaurantes que aceitam afro-americanos. Sensível, emocionante e profundo, embora tocado com leveza, o filme traz belas lições, belas músicas (a cena do bar é magnífica) e sua parte final é maravilhosa, enchendo de beleza todos os corações, o que dentro do contexto significa ser otimista por um futuro que talvez irá existir, sem diferenciar sexos, cores, raças… 9,0

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UM LUGAR SILENCIOSO (A QUIET PLACE)

O filme acaba de ganhar o Critic´s Choice Awards de Melhor filme ficção/terror de 2018. E com seus méritos. A ideia é muito interessante e a realização extremamente competente, ainda mais considerando que seu idealizador e diretor também atua, como chefe da família (John Krasinski), e tendo ao lado sua esposa na vida real (Emily Blunt). Todos com ótimas performances, inclusive as crianças. Mas o forte do filme é o clima permanente de suspense e tensão. Os primeiros dez minutos já são brilhantes e a introdução deixa o espectador preparado e ansioso pelo que haverá de vir. E impressiona, de fato, que um roteiro simples e um filme sem diálogos consiga envolver o espectador dessa forma. Trata-se de um mundo depois do apocalipse, invadido por seres cegos e que atacam violentamente quando percebem emissões de som. Do meio para o final, quando aumenta a tensão, resplandece a qualidade do som e a trilha sonora passa a ser espetacular, imprescindível, elevando suspense ao máximo patamar, inclusive de forma quase insuportável em algumas cenas. Dentro do gênero (ficção/suspense/terror), realmente um filmaço e para os mais medrosos um excelente teste para os nervos.  8,8

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PRIMER

Como bons seguidores de alguns dos grandes nomes da ciência/informática, os personagens aqui são inventores de garagem, atividade que exercem na casa de um deles, paralelamente à profissão de cada um. O estilo da filmagem combina com isso, parecendo meio amadora. Não há nada daqueles aparatos comumente vistos em filmes de ficção científica, com máquinas e luzes, ordenados e funcionando sistematicamente. E vê-se que os quatro homens (inicialmente, depois apenas dois aprofundam a busca) tentam descobrir novidades que possam interessar/inovar o mercado a qualquer custo, utilizando sucata, material barato e de origem mais fácil e rápida, mas com a ajuda de seus conhecimentos específicos tecnológicos/científicos, os quais incluem física elevada etc. O espectador vai ter que tentar acompanhar os fatos, sem perder detalhes e o fio da meada, o que no início – embora estranho, porque os diálogos são lacônicos e nada didáticos – não é tão complicado, mas o desenrolar do filme vai mostrar que se trata de uma tarefa hercúlea. Os projetos em andamento parecem às vezes meio “gambiarra”, outras vezes promissores, mas a capacidade do grupo (ou da dupla) aparenta ser inquestionável e a trilha sonora cria um suspense bem adequado às expectativas. O filme dá a impressão de que o roteiro tem total embasamento científico, inclusive porque ganhou o Festival de Sundance de 2004, o que é um indício de seu mérito, afinal. Mas a ação transcorre sem muita novidade, até que alguma coisa acontece e os dois amigos se veem diante de algo que acreditam seja grandioso. A partir daí, o filme envereda por caminhos mais complexos e das duas uma: ou se torna fascinante para o espectador, que deseja resolver os mistérios e ir encaixando as peças complicadas – até podendo se colocar no fascinante lugar de um cientista que de repente inventa algo inusitado – ou  se torna um tédio absoluto, pela falta de compreensão (progressiva) sobre os fatos que estão ocorrendo. A dificuldade de entendimento da história obviamente desestimula. De minha parte, já vi o filme duas vezes e não consegui compreender bem certas coisas e nada entendi de outras. Fico até em dúvida sobre se a maior parte das pessoas terá condições para absorver todas as sutilezas e criar um sentido lógico nas coisas. De todo modo, o filme foi premiado e é polêmico. O diretor e roteirista é o mesmo ator que interpreta o Aaron, Shane Carruth.    7,8

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A FAVORITA

Em um belo trabalho de reconstituição de época, iluminação e fotografia, brilha o trio Olivia Colman, Emma Stone e Rachel Weisz, com os personagens das duas últimas mostrando esforços para ganhar o favoritismo da rainha Ana (interpretada pela primeira), ao mesmo tempo em que a soberana, instável emocionalmente, doente de corpo e com cara de permanente enfastio, exercia o comando absoluto do reino poderoso da Inglaterra do século 18, colocando sob sua autoridade os estrategistas, os sensatos, enfim todos os súditos, cujo dever de obediência era indeclinável, embora oscilando as ordens conforme o humor real e por isso mesmo colocando muitas vezes em risco a ordem vigente e as relações de paz, guerra, conquistas e defesa. O filme lembra um ou outro de época de sucesso, pelo permanente clima de sedução e intriga (muito valorizado pela trilha sonora), mas aqui com interesses pessoais diferentes dos da mera vaidade, em um jogo estratégico cuidadosamente elaborado. Há, porém, não apenas o retrato da opulência da Corte, mas muitas críticas/humor negro e sutilezas, as quais inclusive se revelam pelos próprios ângulos de câmera e as lentes utilizadas sob comando do excelente e geralmente não-convencional diretor grego Yórgos Lánthimos (O lagosta, O sacrifício do cervo sagrado). As três atrizes foram indicadas ao Globo de Ouro, tendo Olívia Colman vencido na categoria de Melhor atriz em Comédia ou Musical. Além disso, o filme também foi indicado nas categorias de Melhor Comédia ou Musical e Melhor Roteiro de Comédia ou Musical. Durante os créditos finais uma surpresa: Skyline Pigeon de Elton John executada com um belíssimo e inusitado arranjo medieval.  8,8

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ACREDITE EM MIM – O RAPTO DE LISA MC VEY

Um telefilme baseado em fatos reais e extremamente bem feito, parecendo quase um documentário. Katie Douglas tem uma ótima/memorável atuação e o filme retrata fatos que realmente parecem inacreditáveis, pela maneira como ocorreram. Alguns deles efetivamente impressionantes. À medida em que o filme vai avançando a atenção do espectador passa a ficar refém da ação, havendo inclusive alguns momentos de grande emoção, principalmente na parte do meio para o final. Foi feito para a TV e no início é interessante que não se espera muito dele, mas acaba realmente surpreendendo, com uma história recheada de ótimos ingredientes de drama, mistério e suspense policial.  8,4

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PODRES DE RICOS (CRAZY RICH ASIANS)

Esta é uma comédia romântica de ritmo perfeito, muito colorido, alegria, músicas, juventude, costumes ocidentais e orientais em exibição e conflito, com direção e elenco afinado e um estilo que vai entreter jovens e adultos, muito parecido com filmes como Quatro casamentos e um funeral, só que com as vestes da modernidade. Tanto do som, da música, das cores e dos costumes, quanto da comparação do mundo ocidental com o oriental em ascensão, o que faz desfilarem na tela imagens belíssimas da ostentação dos ricos e poderosos de Singapura, simbolizando o crescimento do poder sócio-econômico da Ásia sobre a América e o resto do mundo. Os costumes, aliás, são amiúde objeto de cenas e situações dramáticas, no fundo aparecendo as intenções legítimas e inocentes do par romântico central, em torno do qual gravitam interesses altamente relevantes. É um estilo de filme para deixar o espectador alegre, leve e um pouco emocionado com algumas cenas. Uma delas, belíssima, é a do casamento, pelo conjunto da linda música tocada ao violão (Can´t help falling in love, por Kina Grannis) e das imagens, inclusive inesperadas da cerimônia. A cena final é um deslumbre e confirma a pujança do Oriente moderno, embora o filme deixe claro que acima disso tudo estão os valores do coração. Um filme que vai do bobinho (inclusive as primeiras cenas da amiga asiática são ridículas) e do banal até uma realidade inegável e que cresce bastante do meio para o final, consistindo em ótima diversão, a tal ponto de ser indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme Musical ou Comédia. O elenco – basicamente composto por asiáticos –  é muito bom, com destaque para a atriz Constance Wu. 8,0

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COLETTE

Uma delícia ver filmes de época da Paris da efervescência cultural do final do século 19 e início do século 20. Aqui um drama biográfico e supostamente baseado em fatos reais, envolvendo uma personagem feminina que ousou desafiar sua época e a sociedade parisiense com sua ousada literatura. Só que ela era um ghost writer, ou seja, escrevia para o parceiro, que colocava todas as obras em seu próprio nome. A atriz Keira Knighley amadureceu muito ao longo dos anos e alcançou um equilíbrio notável como atriz, a ponto de poder enfrentar qualquer papel, mesmo que de nuances delicadas no campo musical e até erótico. Pois a personagem que representa era uma livre pensadora e, assim, liberta em seus atos e atitudes sociais, embora engessada pela própria época opressora. Mas ela tem um parceiro à altura: o ator Dominic West, da série The affair, desempenha muito bem o papel do escritor que se aproveita do talento da esposa para brilhar, em uma época em que as mulheres estavam apenas engatinhando em busca de seus direitos. O roteiro conta fatos que efetivamente aconteceram e que mexeram com a Paris da época, mostrando um pioneirismo feminista de grande destaque no mundo literário e artístico e o filme transcorre com expectativas e algum suspense quanto ao desenrolar do drama, que no todo acaba ocorrendo a contento, porém sem grandes arroubos, embora o brilhantismo da interpretação da atriz.  8,0

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THE BALLAD OF BUSTER SCRUGGS

A simples menção de se tratar de uma obra dos Irmãos Coen significa ao mesmo tempo várias qualidades: roteiro criativo, inteligente, produção impecável, fotografia primorosa e ângulos diferentes, trilha sonora perfeita, tudo muito bem cuidado, originalidade e surpresas. Bom gosto, embora em geral com muita ironia fina inserida no contexto. Aqui, o título do filme é o do livro no qual se baseou e dá nome à primeira de várias histórias dos tempos do faroeste, que vão sendo contadas cada uma com um olhar particular, em uma bela reconstituição de época, valorizada pelas paisagens deslumbrantes do velho oeste. Contudo, em que pesem os elogios acima, alguns histórias pecam pela demora na resolução e na insistência dos temas filosóficos. Pode ser que nos tempos do western os fatos ocorressem assim, com tal mornidão, mas muitos momentos ficam enfadonhos e o filme se torna cansativo em vários episódios. Em resumo, a categoria dos Irmãos está presente em cada cena e se trata de um filme acima da média e com ideias boas, algumas inovadoras. Entretanto, o resultado de algumas histórias não é o esperado e obviamente esse fato prejudica um pouco o todo. Mesmo assim, um filme apenas bom dessa dupla já é superlativo à média que anda por aí e por esse motivoa obra merece ser conferida.  8,3

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WHITNEY

Doloroso é um termo que normalmente não se aplica a documentários. Ou a filmes estilo documentário, que geralmente são os biográficos. Mas aqui efetivamente não é nada prazeroso para os fãs contemplar a decadência de uma das maiores vozes que a música já teve: Whitney Houston foi uma diva e será sempre lembrada por interpretações memoráveis de canções que se perpetuarão pela história, tendo sido a única cantora americana a alcançar por sete vezes consecutivas o topo das paradas de sucesso. E justamente por isso, por esse imenso talento e pela imagem que todos guardamos dela, é que nos toca profundamente o destino que acabou seguindo em razão das drogas e que este filme mostra de forma incontestável e realista. Sob o ponto de vista cinematográfico, porém, obviamente é uma obra de valor, principalmente em sua primeira parte, que constrói os alicerces pessoais e familiares para a meteórica ascensão, com vários depoimentos, imagens de arquivo e da própria cantora. Na segunda metade o filme mostra a desconstrução do mito e se torna menos elaborado, embora prossiga causando emoções.  8,0

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THE SISTERS BROTHERS

Um grata surpresa, um filme realmente diferenciado dentro do gênero. Um faroeste que se passa no Oregon e na Califórnia, na virada do século 19 para o século 20, mas que aprofunda especialmente os personagens e enfoca nos detalhes, o que resulta na perfeita sintonia dos elementos: roteiro, fotografia, direção, elenco, trilha sonora (excelente e em alguns momentos bastante original). O diretor é o francês Jacques Audiard (Dheepan, Ferrugem e Osso, O profeta…), que elabora uma fabulosa reconstituição de época, na qual o progresso se mesclava à selvageria do Velho Oeste (a escova de dentes ganhou seu destaque, junto com a química), com o crescimento das cidades e da civilização, embora ainda bastante exigida do homem uma extraordinária capacidade de sobrevivência, inclusive em meio à corrida do ouro da Califórnia, que levou muitos à riqueza, mas outros à bancarrota ou à morte. Os dois irmãos “Sisters” são magnificamente interpretados pelos versáteis John C. Reilly e Joaquin Phoenix, havendo ainda no elenco Jack Gyllenhaal, Riz Ahmed e Rutger Hauer. O andamento é lento, mas o filme vai ficando cada vez mais forte e nunca perde o notável equilíbrio e a coerência do tema, que além de pontificar um precioso sentido de união entre irmãos, ressalta o que, afinal, parece ser o verdadeiro significado de toda a busca, na simplicidade do retorno à paz e ao aconchego.   9,0

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THE PASSIONATE FRIENDS (A HISTÓRIA DE UMA MULHER)

Este filme inglês, de 1949 e muitíssimo bem dirigido e co-roteirizado por David Lean (A ponte do rio Kwai, Lawrence da Arábia, A filha de Ryan, Doutor Jivago, Passagem para a Índia…), é enquadrado por muitos como um melodrama, embora pertença a uma fase do cinema – como dizem alguns – em que havia efetivamente histórias a serem contadas, ou seja, roteiros consistentes. Mas de fato não é justo tal enquadramento. Porque embora o filme pareça a princípio uma bobinha história de amor, na verdade não é bobinha e nem propriamente uma história de amor. É muito mais profundo que isso. É uma história de conflitos e sentimentos vários, que discute de forma densa situações humanas de ambiguidade. E que quando parecem se definir acabam se mostrando contraditórias inclusive ao que normalmente se espera socialmente. Pode ocorrer a pergunta: é possível se amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo? A temática em seu fundo é muito interessante e na parte final do filme há momentos de grande intensidade dramática e psicológica, com boa carga de suspense e tensão e imprevisibilidade quanto ao seu final. Mérito também do elenco, protagonizado por Ann Todd, Trevor Howard e Claude Rains.  8,5

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INFILTRADO NA KLAN

Este filme está recebendo prêmios e várias indicações e tem o mérito da direção de Spike Lee e de enfrentar de peito aberto um tema bastante delicado para os americanos: o ódio racial (a primeira cena é impactante e bastante corajosa). E o faz mostrando com tons de drama e comédia um fato real – embora bastante improvável – ocorrido em 1978: um dos raros policiais negros da época (do Colorado) conseguindo se infiltrar no universo da Ku-Klux-Klan. Daí em diante, diversas facetas da época são mostradas, inclusive com o tom de crítica às ideias racistas, o que acentua a importância do roteiro. O filme é às vezes leve, outras vezes denso, tem um bom ritmo, mas tirando essas feridas não cicatrizadas que o cinema americano teima e precisa amargar de tempos em tempos, trata-se apenas de um bom filme. Nada além disso: um filme bem feito e com boas qualidades. Muito longe de ter o mérito dos vários prêmios a que vem sendo indicado, mas a máquina de Hollywood não pode ser desprezada e quando ela resolve eleger seus favoritos, o melhor é ficar atento. Ainda mais quando o diretor tem o currículo de Spike.  8,0

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THE WAVE

O nome infelizmente é o mesmo de outros filmes anteriores, produzidos em épocas diferentes e de temáticas diversas, podendo gerar alguma confusão. No caso, o gênero desta obra poderia ser simplificado como sendo o de “cinema-catástrofe”, uma espécie de filme que os EUA popularizaram em décadas passadas e que fizeram explodir na bilheteria diversos espetáculos de ação, suspense e efeitos especiais, como Inferno na torre e Terremoto, diversificando seus temas ao longo do tempo mas permanecendo com a mesma “matriz” dramática, sem grandes inovações de estilo. Previsíveis e repletos de clichês. E justamente aí é que cessam todos os elementos de comparação deste filme com os citados e os que os sucederam, pois aqui o cinema não é o americano e sim o norueguês, o que já traz de imediato grandes diferenças e repercussões: o filme narra fatos a respeito de uma realidade dentro do país, relacionada com seus fiordes e com o permanente monitoramento de rochas e montanhas, pois qualquer alteração geológica/tectônica pode precipitar avalanches/inundações/tsunamis. O grande diferencial deste filme é que não é apenas um filme de aventuras que pretende retratar uma realidade pungente e permanentemente latente na Noruega, mas a verossimilhança: tanto o roteiro, quanto as interpretações são realistas e sentimos tanto a possibilidade dos fatos, quanto os dramas vividos pelos personagens, muitíssimo bem interpretados. Não há aqueles estereótipos irritantes do cinema ianque, enfim. Cinema de qualidade, que foi a maior bilheteria da Noruega em 2015 e representou o país para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2016, embora não tenha sido nomeado.  8,8

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TODOS LO SABEN (EVERYBODY KNOWS)

Como é bom ver o talento em ação! Como é prazeroso apreciar a atuação de um elenco magistral e se deleitar com os momentos que tal performance propicia! Ao constatar os três nomes que comandam o filme, o cinéfilo já poderá antecipar grandes momentos dramáticos, afinal não é comum reunirem-se Penélope Cruz, Javier Bardem e Ricardo Darín em um mesmo filme. E não há qualquer decepção, pois se trata efetivamente de um belo filme. Sob a batuta do premiado diretor iraniano Asghar Farhadi (A separação, O apartamento…), este drama espanhol abriu o Festival de Cannes de 2018 e foi indicado a dezenas de prêmios, trazendo além do excelente desempenho de todo o elenco, uma história pontuada por fatos de alta carga dramática e emocional: a partir de um acontecimento gravíssimo e que remexe com toda a família e com os que a cercam, eclodem conflitos familiares, segredos se revelam, dúvidas e mentiras aparecem e muito suspense (inclusive psicológico) e mistério toma conta do enredo, seguindo caminhos de um romance policial investigativo. O roteiro é ótimo e apresenta momentos de grande emoção, que realmente exigem dos atores e atrizes o máximo de sua arte. Foi filmado na Espanha.  9,0

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O RETORNO DE MARY POPPINS

Primeiramente: acho uma bobagem ficar comparando este filme com o de 1964, em que a “babá-mágica” foi magistralmente interpretada por Julie Andrews, que criou um inesquecível personagem, também valorizado pelo fato de que a atriz era também cantora e o filme é um musical – esse aspecto de não-comparação à parte, uma das críticas deste filme é não “rememorar” nenhuma das canções da primeira edição. Então, vista a obra como algo novo e singular, trata-se de um espetáculo quase perfeito, com uma técnica e cenas maravilhosas, magia, sonho, infância, paixão, sentido de família…tudo integrado e com um ritmo irresistível e coreografias perfeitas, uma ou outra memorável. Somos transportados para a fantasia e para as coisas boas e belas da vida!  E Emily Blunt desempenha com rara perfeição o papel título, cumprindo com louros a difícil missão e por esse motivo sendo com justiça indicada para o prêmio de Melhor Atriz no Globo de Ouro que se avizinha (dia 6 de janeiro próximo). Aliás, há outras 3 indicações: Melhor Filme Musical ou Comédia, Melhor Ator em Musical ou Comédia (Lin-Manuel Miranda) e Melhor Trilha Original. O filme tem cenas fabulosas, inesquecíveis e emocionantes e é realmente quase perfeito, talvez pecando por ser um tantinho longo demais. O diretor é o festejado Rob Marshall (Chicago, Memórias de uma gueixa, Piratas do Caribe…).  9,5

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LA STANZA DEL VESCOVO (A ALCOVA DO BISPO ou VENHA DORMIR COMIGO ESTA NOITE)

Mais um filme italiano (co-produção francesa) dirigido por Dino Risi (In nome del popolo italiano, Perfume de mulher, Os novos monstros…)  e da década de 70, precisamente de 1977. E uma vez mais com seu ator favorito, Ugo Tognazzi, aqui em parceria com o ator francês Patrick Dewaere. Destaque no filme também para a beleza felina da atriz Ornella Muti, na época com 22 anos. E o fato é que acaba sendo um filme surpreendente, até porque sem um gênero definido, ou melhor, uma mistura de diversos gêneros: ora é comédia, ora é drama, ora é romance, inclusive policial, ora tem erotismo (algumas cenas com ares das nossas “pornochanchadas”), mistério, suspense…não se sabe exatamente por onde a trama está indo, muito menos para onde nos conduzirá e o próprio protagonista (um larápio excêntrico?) é algo a ser desvendado…ficamos com várias dúvidas sobre se estaria havendo alguma trama e quem estaria de fato tramando…Toda essa miscelânea, afinal, acaba compondo um filme interessante e que prende o espectador o tempo todo. Talvez seu enfoque principal atraia mais o público masculino, pois todo o ponto de vista se forma a partir do universo dos homens, mas seja como for é um entretenimento apreciável, interessante e que surpreendentemente não perdeu boa parte de seu fôlego depois de mais de 40 anos.  8,5

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IN NOME DEL POPOLO ITALIANO (IN THE NAME OF ITALIAN PEOPLE)

Produzido um ano depois da copa do mundo de 1970 (fato muito importante dentro do roteiro), este filme apenas aparentemente é uma comédia despretensiosa e corriqueira de costumes – e que não esquece do caráter espalhafatoso inclusive da língua. Na verdade, trata-se de um drama com tons de comédia, mas contendo uma ácida crítica social: mostrando o descaso com os prejuízos que o progresso desenfreado provoca (para a natureza e a saúde principalmente), a corrupção, o povo alienado e a crise do poder judiciário…e tudo isso em meio a uma investigação policial, sobre um crime que também ocorreu em ambiente corrupto e de favores, no meio das classes mais favorecidas. Os opostos no filme, representando o duelo sagaz e afiado (como muitos diálogos) entre o crime e a lei, são simplesmente dois ícones do cinema italiano e só por eles o filme já valeria a pena: Vittorio Gassman e Ugo Tognazzi. Mas o roteiro é muito inteligente e de quebra o diretor Dino Risi (Perfume de mulher, Os novos monstros…) também nos dá um painel da época e nos brinda com vários daqueles tipos italianos que Fellini se dedicou a retratar em seus filmes. A cena final é maravilhosa, porque apesar de chocante e inesperada para alguns, escancara o eterno dilema da batalha entre a lei e os princípios. 8,9

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ROMA

Este filme é algo raro e vem sendo premiado por onde passa. Talvez acabe sendo realmente uma obra marcante na história do cinema, mas de todo modo os prêmios têm razão de ser. Deve ser destacado, primeiramente, que foi filmado em preto e branco, talvez para acentuar seu caráter autobiográfico, pois enfoca a vida familiar do diretor Alfonso Cuarón (o mesmo de Gravidade) ou, quem sabe, para enaltecer o próprio passado, pois os fatos ocorrem na década de 70 no México, época de turbulências e, claro, como sempre das desigualdades sociais, uma das temáticas do filme. O título se refere ao nome do bairro onde viveu a família do diretor (Colônia Roma), uma família de certas posses e que é mostrada em seu cotidiano, incluindo os pequenos dramas conjugais e seus reflexos. Pensando bem, talvez Cuarón tenha imaginado criar sua própria Roma, como Fellini o fez, afinal o diretor italiano era pródigo em filmar histórias autobiográficas…Mas, em segundo lugar, o importante é o paralelo da história da família com os dramas da empregada/babá Cleo, que tem sua rotina e intimidade radiografadas pelo roteiro, mostrando tanto os conflitos de classes, como o próprio modo de viver da classe pobre no país de paradoxos. Cleo é brilhantemente interpretada pela estreante Yalitza Aparício e o filme deverá ganhar o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, sem dúvida alguma. Em terceiro lugar, mas não menos importante e certamente o que torna o filme um grande destaque e nos provoca total deslumbramento o tempo todo: a fotografia! Cuarón não apenas escreveu, produziu, roteirizou e dirigiu o filme, como também foi o mestre realizador de uma fotografia absolutamente magnífica e que é destaque absoluto da produção. Há cenas que parecem pinturas e uma especialmente na parte final do filme é uma obra de arte pictórica. Aliás, a cena da praia (a do cartaz do filme) é uma das memoráveis do filme, não só pela imagem em si, mas também pelo significado dentro do contexto. O diretor é muito inteligente e sensível, sabe colocar sutilezas e até surpreender e construiu momentos inesquecíveis em uma obra coesa, enxuta e que mostra um painel humano e histórico com grande profundidade e impacto (as cenas da matança dos estudantes de 10 de junho de 1971 – o Massacre de Corpus Christi ou Halconazo – e a cena do parto são difíceis de esquecer). 9,0