BAD LUCK BANGING OR LOONY PORN
Este é um filme romeno, estilo “de arte” e absolutamente desaconselhável para menores. Basicamente pelas cenas dos primeiros minutos, que são explícitas. Na verdade é um filme para adultos que apreciam coisas diferentes. Esse “diferente” é no modo de passar mensagens político-sócio-filosóficas. Na verdade, somente após a metade do filme é que reconhecemos tanto as intenções do cineasta (Radu Jude, romeno), quanto seu mérito, porque até então o filme é excessivamente moroso, parecendo querer mostrar (e de fato) apenas como é a vida atual no país, a aparência e os costumes dos romenos, onde convivem tradições com modernidade (como roupas, Iphone etc). Com o desenrolar do filme, em sua parte final, vamos constatar de forma intensa os contrastes ainda existentes, resíduo dos regimes e das revoluções, em todos os sentidos, por que passou o país ao longo de sua história. Até a metade o filme é enfadonho, não parece levar a lugar algum e a vontade do espectador é até de desistir. Mas a persistência – que se dá também por alguns lampejos indicando vida inteligente – vai trazer recompensas. Uma das divisões anárquicas do filme traz um dicionário irônico, contundente e contestador, onde as palavras vão se alternando e cenas e frases são postas de forma chamativa, contando a história, trazendo filosofias (algumas parecendo fúteis/baratas), mas já mostrando que o filme tinha intenções outras, que não as que pareciam de início. Aliás, tanto as cenas iniciais como outras e alguns diálogos, tiveram claramente o intuito provocativo, tudo dentro do espírito anárquico do diretor. Na parte que precede o epílogo (onde criativamente somos colocados diante de três finais possíveis!), ocorrem as cenas principais do filme, onde haverá diálogos e discussões a respeito dos fatos que levaram uma professora a um impasse limite, mas os temas aqui serão de uma amplitude inesperada e levarão o espectador a uma viagem de conceitos, preconceitos, intolerância, homofobia, misoginia, misturados com alguma racionalidade, respeito e bom senso. Essa porção do filme o redime por completo de qualquer enganosa percepção inicial e é muito interessante e envolvente. Existes muitos diálogos afiados, inteligentes e até mesmo atrevidos, textos lidos pelos personagens e a título de exemplo extraí um deles, que conclui a história contada no filme, de Perseu, herói grego (semideus), que ao enfrentar a Medusa, sob a orientação da deusa Atena ( deusa grega da sabedoria, justiça e artes – para os romanos Minerva), tomou todo o cuidado para não olhar diretamente para a rainha das górgonas, pois se o fizesse viraria pedra. Perseu, então, refletiu todo o mal vindo da Medusa com seu escudo polido e a derrotou. E a frase que advém dessa história é de que “A tela de cinema é o escudo polido de Atena”. Em outras palavras, o Cinema, ou a Arte, é o veículo colocado à nossa disposição para olharmos para os horrores do mundo de uma forma que de outro modo não conseguiríamos assumir. Um filme provocador, ousado e original, por um cineasta sem temor de criticar profundamente o presente e o passado da história sócio-política de seu país. O filme ganhou o prêmio máximo (Urso de Ouro) do recente Festival de Berlim (março de 2021). 8,6