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MAIS QUE AMIGOS: VIZINHOS (STUCK TOGETHER)

Uma comédia francesa, focada na Covid, na pandemia e nos efeitos produzidos nas pessoas, nas famílias, nas comunidades -aqui um condomínio de moradores-, que se passa em Paris (que rende belíssimas imagens, inclusive das ruas vazias pelo isolamento social). Mas é verdade que em mais da metade do filme somos algozes e depois nos tornamos reféns. Porque a maior parte do filme abusa dos estereótipos, de comportamentos anacronicos e exagerados, pelos quais se percebe inclusive que quase todos os homens do filme são idiotas, burros ou insensíveis. Nos tipos caricatos não faltam o vizinho neandertal, o viciado em compartilhar nas redes sociais o seu lado atlético de ser, o cientista que tenta achar a cura para a Covid, além de alguns tipos femininos padrões , imersos nos temas sociais que incluem a cegueira nas relações familiares e de vizinhança. Apesar disso, há momentos que nos provocam risos, muitos com humor inteligente, mas que muitas vezes parecem perdidos em meio ao escracho e ao pastelão. Só que surpreendentemente, a certas alturas, além da metade do filme (quando muitos talvez até poderiam desistir pelo acúmulo de tolices), as coisas mudam totalmente de figura, a necessidade da normalidade parece contagiar os personagens e desse ponto até o final o filme dará uma reviravolta e nos conduzirá, dentro da mesma miscelânea de acontecimentos, a um desfecho tocante e maravilhoso. Quando então percebemos (com razoável certeza) que tudo aquilo foi simplesmente um recurso utilizado pelo roteiro e pelo diretor do filme (Dany Boon, que também interpreta o papel do marido da loira magra) para fortalecer sua mensagem: que é justamente a de mostrar a convivência forçada das pessoas, as confusões e desencontros que esse fato provoca, mas também e principalmente a necessidade de todos unirem esforços para enfrentar a situação da maneira mais honrosa e pacífica possível, privilegiando as virtudes de cada um, como a camaradagem, a amizade, o amor e a generosidade. A parte esteticamente caprichada do encerramento do filme denota claramente ter havido por trás da produção inteligência e competência. Vemos que a vizinhança permanente obrigatória, trazida pela doença, não é fácil, mas a pandemia obrigou a todos uma mudança de olhar, sobre a vida e sobre as pessoas, na busca da paz interior e da harmonia. O título em inglês é ótimo para esclarecer sobre a temática do filme, nesse sentido sendo complementado pelo excelente e criativo cartaz. Esta produção Netflix mistura, muitas vezes de forma tumultuada, outras de forma agradável e com humor e sensibilidade, o mundo fake, o mundo real e o mundo ideal, esquisitices, non sense e bizarrices, que só uma pandemia seria capaz de gerar. Mas, na verdade, isso tudo é mostrado como só o cinema francês é capaz de fazer, com fluidez de tintas e nuances, apresentando um fundo sério porém com roupagem colorida e divertida e, ainda, com variadas situações tocantes e reflexivas e que nos levam a realmente pensar que a única resposta para tudo isso acaba sendo, afinal, o amor e a solidariedade. 8,7